Pedrinho morava em um casebresinho, localizado em um bairro de periferia de uma cidade muito pobre, de espírito e de infraestrutura. Não ia à missa aos domingos e dizia sempre que um dia ia mudar seu mundo. Pelos 6, tomando café preto de garrafinha com bolacha na escola, ainda mastigando, dizia aos colegas que um dia faria de sua cidade um lugar muito diferente. Todos riam. Pelos 15, sem namorada, sua única distração era a flauta de boca que um tio da capital deu-lhe no último aniversário. Mas ia sempre a um rio no fim de sua rua, contaminado pelos arrozeiros, onde dizia que haveria um parque um dia. Aos 18, conseguiu concluir o curso secundário e foi morar com aquele tio por uns tempos para prestar vestibular em uma universidade pública. Passou em direito, com classificação notável. Voltou para casa, aos 21, já advogando. Candidatou-se a vereador em sua cidadezinha, sob uma plataforma simples: fiscalizar os investimentos na qualidade de vida para tornar as pessoas do lugar mais felizes. Mesmo com certa fama de ateu, naquele ambiente fortemente católico, o orgulho de ter um doutor no local prevaleceu, e o elegeram como mais votado. Criou conflitos com interesses resistentes a mudanças, fez projetos ousados, denunciou maracutaias e foi ameaçado de morte. Mas sobreviveu para se candidatar a prefeito. Nunca esquecendo de seu compromisso com os mais desvalidos, investiu em saneamento, habitação, capacitação profissional e desenvolvimento local. O Parque, que tanto havia projetado, se concretizou pelas mãos de um grande arquiteto nativo, agora morando em Brasília, no entorno do rio que visitava na infância. Graças o bom desempenho, agradou a todos, se reelegeu e transformou ainda mais para melhor seu local. Hoje, a cidade é referência em qualidade de vida. E Pedro, afastado da política, sem esposa ou filhos, coordena uma ONG local. Volta e meia essa entidade é notícia regional, e pela qual eventualmente palestra em universidades. Corre em bocas na cidade que quer ser deputado; outros falam que enlouqueceu. Mas quando perguntado, diz que ainda acredita em uma sociedade em que todos são responsáveis pelo futuro, e ninguém é dono da utopia ou do projeto de vida de uma coletividade. Imaginando que é feliz e atuando nessa orientação, Pedro vive uma vida modesta, marcada pela satisfação de imaginar contribuir para um mundo melhor e, sobretudo, com paz interior. Pedro detesta bailes da "Melhor Idade", mas é muito viajante e namorador, mesmo aos 68. Ele prossegue não indo a missa aos domingos, ainda que tenha se tornado amigo do novo Padre. Com ele, ou com uma eventual compania feminina, toma chimarrão, pesca e admira os pássaros durante o final das tardes; também conversa sobre poesia, filosofia e até política... no parque que ajudou a criar.
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