Ainda que muito almejamos mudar de lugar, modificar nossa posição costumeira em direção a uma condição mais livre, é fato que estamos desacostumados e, predominantemente, despreparados para o novo. Esse ranço, que envolve e domina por meio da rotina e do vício no fazer sempre o mesmo, só pode ser superado com muita concentração e abertura para a transformação interna.
***********************************************
Data:11/set/2013, 11h06min
***********************************************
Data:11/set/2013, 11h06min
Seis ideias para democratizar a comunicação no Brasil
Reproduzido do Sul 21
Seminário sobre Crise da Representação e Renovação da
Democracia debateu novas narrativas e necessidade de reforma da educação (Foto:
Alina Souza/Especial Palácio Piratini)
Seminário sobre Crise da Representação e Renovação da
Democracia debateu novas narrativas e necessidade de reforma da educação (Foto:
Alina Souza/Especial Palácio Piratini)
Como a democratização do acesso da população aos sistemas de
comunicação e de produção de informação pode melhorar a qualidade da política e
da democracia no Brasil? Essa foi uma das perguntas que organizou o debate
“Novas narrativas e reforma da comunicação”, no último dia 6 de setembro,
dentro da programação do seminário “Crise da Representação e Renovação da
Democracia”, promovido pelo governo do Estado do Rio Grande do Sul.
A conversa reuniu Renato Rovai (Revista Fórum), Venício Lima
(jornalista e pesquisador), Lino Bocchini (Carta Capital), Joaquim Ernesto
Palhares (Carta Maior), Antônio Martins (Outras Palavras) e Antônio Castro
(Sul21). Entre os diagnósticos sobre os significados dos protestos de junho, os
sentidos da crise da representação política e a relação disso com a mídia,
surgiram algumas ideias e propostas sobre como melhorar a comunicação que se
faz hoje no Brasil. E melhorar, aqui, significa fundamentalmente democratizar o
acesso da população à uma comunicação de qualidade que coloque os interesses
públicos acima dos interesses privados.
“O que nós precisamos regulamentar na comunicação não é o
conteúdo do Jornal Nacional, mas sim quanto dinheiro do povo brasileiro vai
para o Jornal Nacional, para a Globo, para a RBS; quantas concessões de rádio e
televisão cada empresa pode ter. São temas como estes que precisam ser discutidos
com toda a sociedade”, defendeu Antonio Castro, do Conselho Editorial do Sul21.
Confira algumas das ideias e propostas apresentadas neste
debate:
Renato Rovai: “Mídia livre pode fazer a verdadeira
comunicação pública”
“Estamos vivendo um momento comparável ao que vivemos na
Revolução Industrial, só que agora com uma passagem de uma sociedade industrial
para uma sociedade informacional. Tudo tem a ver com a informação hoje e a
própria dinâmica entre passado, presente e futuro alterou-se profundamente. Uma
das características deste período é uma crise nas relações de intermediação.
Até bem pouco tempo, os veículos de comunicação monopolizavam essa
intermediação com a sociedade. Com a explosão de mídias na internet não
monopolizam mais. Mas a internet ainda é um meio em disputa: pode ser usada
para ampliar as liberdades, mas também para aumentar os controles”.
“Neste novo contexto, temos novos atores que também são
produtores de informação e mídia, o que possibilita que o processo de produção
de informação e comunicação como um todo possa ser muito mais democrático.
Temos, basicamente, três tipos de atores: a mídia tradicional, veículos
independentes e cidadãos comunicadores. A mídia livre, que transita entre esses
dois últimos atores, pode fazer a verdadeira comunicação pública, mas, para
isso, precisa ter apoio do Estado”.
Venício Lima: “Frear um pouco o entusiasmo com as novas
tecnologias”
“Acho que devemos puxar um pouco o freio de mão em relação
ao entusiasmo geral com as novas tecnologias. O risco desse entusiasmo com as
novas tecnologias é achar que a reforma da velha mídia não é mais necessária.
Neste momento, está em curso uma guerra de interpretações sobre o que aconteceu
em junho. Apesar da multiplicidade de demandas, é possível identificar um substrato
comum nas manifestações: o desejo de maior participação popular nas decisões
públicas, em especial no que diz respeito ao modo de organização das cidades. O
cientista político Wanderley Guilherme dos Santos destacou sobre isso um ponto
que é importante: as classes C e D são majoritárias na sociedade civil
organizada, mas são minoritárias no parlamento. Isso é o que a crise da
representação significa”.
“Esse contexto de crise está diretamente ligado ao tipo de
mídia que temos. O tom dominante da velha mídia é de crítica aos políticos e
aos partidos (preservando alguns dessa crítica), reivindicando para si o
monopólio da intermediação com o público e apresentando-se como se não fossem
empresas privadas com interesses privados. Mas temos uma novidade aí: essa
velha mídia tradicional foi associada com esse modelo político criticado.
Apesar disso, ainda dependemos dessa velha mídia para algumas coisas
fundamentais como visibilidade e acesso ao espaço público de debates nacional”.
Antônio Martins: “é injusto que o Estado financie apenas um
tipo de mídia”
“Nós vivemos hoje um processo de sequestro da democracia e
da política. A ideia da Reforma Política precisa ser mais difundida. Ela ainda
não faz parte da agenda nacional. A proposta da Constituinte exclusiva foi
destroçada em algumas horas e a do plebiscito em alguns dias. Neste cenário,
não podemos abrir mão de algumas coisas: definição programática, análise de
correlação de forças, disputa de agenda política. Não podemos abrir mão dessas
noções e ficarmos só com uma postura reivindicatória. Precisamos construir uma
pauta mínima e focar nossa atenção e mobilização nela: pontos como a proibição
do financiamento empresarial de campanhas, a multiplicação de plebiscitos, a
possibilidade de candidaturas avulsas e da revogabilidade e limitação e
mandatos”.
“Outro tema fundamental é o apoio público à comunicação
compartilhada. É injusto que o Estado financie apenas um tipo de mídia. As
mídias compartilhadas deveriam ter direito a 50% das verbas do financiamento
estatal na área. É uma proposta ousada, mas creio que devemos caminhar nesta
direção”.
Joaquim Palhares: “A mãe de todas as reformas é a reforma da
Comunicação”
“A mídia no mundo passa por uma grande crise. A recente
compra do Washington Post pelo dono da Amazon é mais um exemplo disso. Neste
sentido, creio que a mãe de todas as reformas é a reforma da comunicação e não
a reforma política. O principal ministro do governo hoje deveria estar sentado
na Secom (Secretaria de Comunicação),
tal é o poder que a velha mídia exerce hoje no país. Ainda somos extremamente
frágeis perante esse poder, mas ele passa hoje, sem dúvida, por um momento de
grande fragilidade do ponto de vista de sua credibilidade. O editorial de O
Globo sobre o golpe de 64 é um sintoma disso”.
“Aliás, a Globo tem que ser chamada perante a Comissão da
Verdade para dizer como foi esse apoio à ditadura. Há mortos e desaparecidos
envolvidos nesse apoio. Não é um simples pedido de desculpas que encerra essa
discussão. Penso que esse deveria ser um dos principais temas das manifestações
de rua e deveria envolver todos os brasileiros. Mas para fazer tudo isso,
precisamos ter Estado, precisamos ter uma pauta e um programa. As grandes
empresas de mídia recebem bilhões de dinheiro público sem oferecer nenhuma contrapartida.
Não conseguiremos mudar isso sem um Estado republicano forte e sem comunicação
pública de qualidade”.
Antônio Castro: “velha mídia está entre os
super-representados”
“Nos protestos de junho, os meios de comunicação da velha
mídia passaram a ser identificados claramente como parte dessa velha ordem.
Juarez Guimarães disse uma coisa muito importante ontem que me marcou: se
existe uma crise da representação, há setores da sociedade sub-representados e
outros super-representados. Entre os super-representados está a velha mídia. Em
Porto Alegre, em um determinado momento dos protestos, os manifestantes tiveram
que decidir se iam para a frente do Palácio Piratini ou para a frente do prédio
da RBS. E decidiram ir para a frente da RBS, indicando o poder que essa velha
mídia ainda representa. O mito da neutralidade dessa imprensa tradicional foi
abalado”.
“No mês de junho, a nossa audiência no Sul21 aumentou muito
por conta da cobertura que fizemos dos protestos. A nossa fragilidade ainda é
grande, mas o espaço de participação e colaboração que estamos criando é
expressivo e crescente. O que nós precisamos regulamentar na comunicação não é
o conteúdo do Jornal Nacional, mas sim quanto dinheiro do povo brasileiro vai
para o Jornal Nacional, para a Globo, para a RBS; quantas concessões de rádio e
televisão cada empresa pode ter. São esses temas que precisam ser discutidos
com toda a sociedade”.
Lino Bocchini: “fazer jornalismo de qualidade custa dinheiro
e é difícil”
“As rádios ainda são muito importantes na comunicação
brasileira. Elas são a internet atual para muita gente ainda no Brasil.
Precisamos pensar nisso. Não é todo mundo que está na internet. A internet
oferece grandes possibilidades hoje, mas a figura do bom editor segue
imprescindível. Temos muita quantidade que precisa ser organizada. Só esta mesa
aqui publica mais de 100 textos por dia. Ninguém consegue ler tudo isso.
Precisamos ter bons editores.”
“Fazer jornalismo de qualidade custa dinheiro e é difícil.
Não é simples nem barato fazer uma análise de qualidade sobre o que está
acontecendo na Síria e no Egito hoje, por exemplo. Custa caro e, geralmente,
não dá a mesma audiência que publicar um texto sobre um fato envolvendo um
ex-Big Brother. A resposta para fazer esse jornalismo de qualidade não está no
Facebook ou na internet, está nas ruas, na conversa direta com as pessoas, no
olho no olho. É isso que precisamos para fazer um bom jornalismo: ir para as
ruas, conversar com as pessoas”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário