domingo, 30 de novembro de 2014

Provocações do Tião - O Realismo Mágico e o Hipnotismo Trágico

Por Sebastião Pinheiro*

Sobrevivemos ao “realismo mágico”, muito mais real & fantástico que o criado pelo laureado Gabriel G. Márquez e ultrapassa de longe as ficções de Isaac Azimov. E isto não se cinge unicamente aos comportamentos sociais, alcança em cheio a área científica, técnico burocrático.

Como técnico de berço humilde e escola pública de periferia, me enquadro naqueles preteridos pelo douto “professor” capixaba por falta de “estirpe ou pedigree”. Não sou médium, espiritualista, mas percebo no ar a atmosfera e “sentimento de defraudação”, a cada dia mais sólido, que nos remete a profundas reflexões. Uma delas está centrada na releitura das manifestações eclodidas em junho de 2013. Recolheram por razões ambientais adversas, aguardando um novo “alerta laranja” ou seguiram sua órbita de cometa oportunista? Sim, a falta de berço esplendido e educação aristocrática deveriam inibir percepções cívicas.

A última década foi pródiga na fabricação artificial de pseudo capacidade e falso conhecimento, o que não é estranho no uso do dinheiro público sem responsabilidade com os resultados no tempo e espaço e mascaramento através de publicidade e propaganda para impedir clarividência e sustentar festejos.

Quando os “castelos de areia começam soçobrar” é impossível “tapar o Sol com a peneira”, pois o Sol não é um cometa e têm órbita há muito conhecida, o que aumenta o desespero e desolação.

Vem à baila o ditado chinês: “Se tens cereal, plante e colherás uma vez; se tiveres semente de fruta, colheras dez anos e plantando uma árvore colheras cem anos, mas se há tempo eduque o povo”. Mas, para isso não bastam os aparelhos ideológicos de Althusser para enfrentar os modernos leviatãs.

O exercício de governo (gestão de poder) através de pagamentos mercenários erode o conteúdo educativo ao longo do tempo e quem não semeou sentirá opressão, angústia (política), agruras da fome social e reclamará das desgraças noticiadas pela imprensa, oposição e aliados.

É obvio que a escalada de violência organizada: Reivindicações violentas perante qualquer contrariedade, como exercício de poder perante a ordem; Ônibus queimados sistematicamente por motivos fúteis ou ordem de presidiários; Escalada de chacinas e enfrentamentos entre “soldados do tráfico” e os bandos de recolher; Cotidiano noticiário sobre a violência policial semeando medo e terror. Banalizações que embrutecem e não permitem recordar ou perceber:

1. Uma menina de 15 anos de idade foi colocada em uma cela prisional com diversos presos e foi sistematicamente estuprada durante uma semana, em Abaetetuba, PA (2007) sendo a governadora, da Frente Popular, intransigente defensora dos Direitos Humanos e Feminista...

2. Crianças de escolas infantis privadas na BA e SP envenenaram brigadeiros com “chumbinho” (ou Aldicarb, arma química binária desenvolvida pela Union Carbide para a Guerra da Coréia, que em meio alcalino forma Sulfóxido com a Dose Letal 0,004 mg/Kg de Peso Vivo, e que, hoje, é vendida no metrô do RJ por traficantes para matar ratos ou sinergizar os efeitos da cocaína). Os confeitos com chumbinho foram dados às respectivas professoras, casos mais graves que o do técnico que se propôs a devolver 256 milhões de reais roubados à Petrobrás. Entretanto, todos são induzidos a se escandalizar com a corrupção (concussão), roubo de dinheiro público.

3. O judiciário processa a Agente de Transito para proteger o juiz de direito infrator...

Toda e qualquer gestão vai muito além do conhecimento, propaganda e dinheiro, e, é inócua se não houver sabedoria e honestidade cívica para superar vícios e armadilhas pessoais ou segmentárias nas vicissitudes da Sociedade. Isto está nas entrelinhas de Maquiavel, pois o “conhecimento é ortemente influenciado por sentimentos de ideologia, política e mercado com ansiedade de consumo”.

Em contraponto, a “sabedoria” é a essência depurada dos sentimentos referidos com a finalidade única, republicana, muito além dos devaneios liberais, cometas sediciosos em intentos totalitários.
Quem se lembra da primeira Medida Provisória 113/03 para viabilizar a quase totalidade da soja clandestina Roundup Ready contrabandeada com a vista grossa do governo anterior. Houve seu “upgrade” logo em seguida e em ato continuo o liberou geral MP 131/03 (foto). Poucos irão recordar que as autoridades vieram a público autorizar o aumento na concentração de resíduos do herbicida Roundup em 100 vezes na água. Quem autorizou sabia, pois foi alertado que na água potável o herbicida pode ser evaporado durante dias e não se decompõe a não ser quando a temperatura é superior a 220 Celsius, quando ele se transforma em 1,4 Diisopropyl-2,5-Di-keto Piperazine. Esta substância uma vez ingerida por ação metabólica no estomago volta a transformar-se em Glyphosate formador de Nitrosaminas.

Que saudade de todo o ativismo sobre agrotóxicos e transgênicos, objetos para mobilizar e despertar consciências, educar. Nas duas décadas anteriores vimos a imposição do Departamento de Estado através do vice-presidente Don Quayle, e depois, principalmente, do presidente Clinton em favor da corporação de Biotecnologia (Monsanto) interessada na hegemonia tecnológica. Essa é a “linhagem ou pedigree” bem aceita na Vaca Sagrada de Illich.

Em um país onde as “modernas capitanias hereditárias” são “chefiadas por famílias” cujas fortunas foram construídas por “participações”, botim ao Tesouro Nacional e venda de facilidades a interesses segmentários, verbigracia, o corriqueiramente comentado sobre o “primeiro filho” e as sementes transgênicas.

Violências de comportamentos e costumes, situações de medo e terror, narcóticos, assassinatos veiculados sistematicamente fomentando ódio, comoção psicossocial e caos oportunista, seja pelos próceres do Estado Híbrido do Século XXI, sob a batuta das corporações ou por seus antagonistas, não é “ficção” ou “realismo mágico” dos autores laureados.

Em gestão pública conhecimento, publicidade e dinheiro são inócuos se não houver sabedoria e honestidade cívica para superar vaidades, vícios, armadilhas pessoais ou segmentárias. De nada adiantou ganhar os debates e a sociedade, fomos traídos pelo gestor político e acatamos democraticamente, mas silencio não é esquecimento, nem cumplicidade.

Hoje, em meio a uma estiagem centenária, quanto de resíduo de herbicida há na água do volume morto? Em meio à comoção psicossocial o ladino jornalista, ecologista, vem a publico “educar” para a necessidade de TOMAR ÁGUA DE ESGOTO CLOACAL-INDUSTRIAL, quando a verdadeira intenção é aumentar a demanda pelas FALSAS ÁGUAS MINERAIS da Nestlé e Coca-Cola e aumentar o preço, mas isso não é corrupção.

Em 1999 a socialite Vera Loyola Brandão deu uma gigantesca festa para sua cachorrinha Pepe (foto) e escandalizou a nacionalidade. Mas, por que a preocupação, se a novela que, agora, aterroriza o país tem outro juiz federal, diferente, que tem no nome o que o anterior tinha na pele.






Hoje, na TV nos intervalos dos capítulos aparece a cachorrinha delicada e o anúncio que sua ração N& D que NÃO CONTÉM TRANSGÊNICOS (foto), significando que não contém também resíduos de herbicida causador de leucemia, segundo os cientistas suecos da Universidade de Lund...

O porcentual de participação da indústria no PNB caiu de 22 para 12% e em quanto aumentou a porcentagem de participação das transnacionais na Agricultura? É parte do show?

Continuarão as crianças, vítimas de facínoras uniformizados ou recheando brigadeiros com “chumbinho”? Outro alerta laranja retornará o cometa? Quem ganhará essa guerra?

Confesso que tudo é secundário, já que penso no que disse Simon Rodriguéz, mestre e mentor de Bolívar: “La América latina es original, originales han de ser sus instituciones y su gobierno, y originales sus medios de fundar uno y otro. O inventamos, o erramos.”

Erramos. A carência de cidadãos e elite autênticos é o que abre espaço para a estupidez, incompetência e roubalheira, mas há formas e tempo para consertar.


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Engenheiro agro-químico, escritor e ambientalista.

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