terça-feira, 21 de abril de 2015

Provocações do Tião - O último rinoceronte branco e as raízes de um negócio

Sebastião Pinheiro*


No fim de semana debrucei-me trans- e interdisciplinarmente sobre a ética e moral nos naufrágios no Mediterrâneo para entender o último rinoceronte branco (do norte), mas têm muitos que não entendem o significado.

Permitam demonstrar: Na minha infância fui vizinho ao Castelo Baruel construído em 1879 e perto dele foi construída a Capela de Santa Cruz por mim freqüentada entre 1957 e 1959, onde auxiliava o padre prussiano, ex-capelão militar, como “coroinha”. Ele usava aquela igreja para uma comunidade na maioria idosos alemães. Com os pais do padre aprendi as primeiras palavras em latim e alemão, pois a missa era rezada nos dois idiomas, assim como as músicas cantadas e acompanhadas no piano. Todos os domingos às seis da manhã eu tinha minha atividade “pastoral” ajudado pelos genitores do padre, meus preceptores após a missa.

Eles haviam morado em Tanganika e vivido a Primeira Guerra Mundial. Foram eles que me ensinaram que a Alemanha convocou através da Conferencia de Berlin, em 1885, as principais potencias européias para organizar o continente Africano, então repartido como uma pizza entre os convidados tendo apenas dois países independentes (Libéria, comprado pelos EUA, e Etiópia, do rei Haile Selassie I), cujo mapa cumpre seu centenário (FOTO). Leia-o.


Exultaram ao saber que meu natalício era no mesmo dia que o de Otto von Bismarck, ganhei como presente de doze anos entrada para assistir o filme “Kirongozi o mestre Caçador” na matinê do Cine Hollywood a 4 quadras da paróquia. O documentário versava sobre a vida de um guia de safári paulistano, J. Alves de Lima Fº, de genealogia cafeeira, que trabalhava com os britânicos matando animais de grande porte na África. Matar um elefante, leão ou rinoceronte rendia, na época, mais de 30 mil dólares, e era um dos negócios mais lucrativo no império britânico pós-escravidão, além do monopólio do marfim.

Caçadores profissionais, ou desportistas, acompanhavam os safáris por segurança e o mesmo ocorria na Índia e em todo o Império Britânico, que lucrou muitíssimo com isso. Só o “chifre de pelos” de um rinoceronte (FOTO) valia mais de mil dólares. No filme uma das cidades era a ilha de Zanzibar, antigo centro de tráfico de escravos, então sede das autoridades da África Oriental Britânica, onde ocorreu a guerra mais curta do mundo, apenas 38 minutos, em 1896.


Esta foto, de Farroukh Bulsara, de ascendência indiana, é da época de Kirongozi e você nem o reconhece, mas vendo a foto adulto e a caráter não há jovem, balzaquiano e anciãos que não reconheçam “Sua Alteza Real do Queens” Freddie Mercury, nascido em Zanzibar. Por que será que não recebeu o título de cavaleiro do Império Britânico?

Se você, com nossa formação de escola pública, procurar no mapa da África Tanganika e Zanzibar terá dificuldades. Aprendi com os pais do padre que venceram a Guerra em Tanganyka na primeira Guerra Mundial, mas perderam a Guerra na Europa e tiveram de entregar a colônia, que havia sido totalmente alfabetizada e entregaram o monopólio do cultivo de Piretro à coroa britânica, que logo o repassou aos norte-americanos. Estes países ficaram independentes em 1961, e diante da expansão do pensamento sobre o “Socialismo Africano” de Lumumba, Bella, Kennyata, Senghor, Nkrumah, Touré, Nyerere, Agostinho Neto e Samora Machel e Thabo Mbeki, se deu a fusão de Zanzibar e Tanganika no dia 26 de Abril de 1964 passando a chamar-se Tanzânia.

Na Rodésia, havia o governo britânico racista de Ian Smith que “ilhava” totalmente o desenvolvimento da recém liberada Zâmbia (ex-Rodésia do Norte). Fortalecida, Tanzânia e Zâmbia, com apoio financeiro, logístico e operacional da China, começaram a construir uma ferrovia de 1.860 Km em meio a pântanos e selva contrariando a vontade dos EUA, URSS, França, Grã Bretanha, e principalmente, do Banco Mundial, pois acelerava o fim da Rodésia e África do Sul do Apartheid.

Julius Nyerere disse: “Todo o dinheiro neste mundo é vermelho ou azul. Eu não tenho o meu próprio dinheiro verde, então onde eu posso obter algum? Eu não estou tomando uma posição da guerra fria. Tudo que eu quero é meios para construir a ferrovia".

O empenho e fraternidade dos trabalhadores chineses (15.000) e africanos (60.000) era tão grande que a ferrovia “Tanzânia-Zambia Railway foi inaugurada com dois anos de antecedência ao previsto no projeto, pois esteve sob comando dos guardas vermelhos de Mao Tsé Tung. Um deles foi meu colega de estudo na Alemanha, que participara como engenheiro agrônomo na construção, pois eles produziam todos os alimentos ao longo do canteiro de obras da Ferrovia. Em uma visita à Casa de Karl Marx, em Trier, desde Saarbrücken, passamos pela Estação de Saarlouis, e o colega chinês disse: Aqui nasceu o “Leão da África”, o General alemão Paul Emil von Lettow-Vorbeck, que com apenas 3.000 soldados alemães e 11.000 soldados nativos treinados (Askaris) na Primeira Guerra Mundial derrotou, reiteradamente, durante quatro anos, mais de 300 mil soldados britânicos, belgas, portugueses e franceses. Ele dizia que a confiança, lealdade e respeito dos soldados africanos orgulhava o prussiano mais radical... Perguntei sobre qual a razão. O chinês, displicente olhando pela janela do trem respondeu. - É que todos os soldados askaris eram bem alfabetizados e tratados de igual para igual e respeitada sua identidade e ambiente. Nós fizemos o mesmo durante a construção da Ferrovia TA-ZA.

O trem estava chegando a Trier, ele finalizou: - Há o esqueleto do dinossauro (Iguanodonte) Dysalotosaurus lettowvorbecki encontrado nas margens do Lago Tanganyka, que está no museu em Berlim e tem como homenagem o nome do general (FOTO). A China também foi dividida como uma pizza, em 1865, depois de ser imposta a ela o consumo de ópio monopolizado pelos ingleses e somente com a revolução vermelha ficamos livres. Para muitos dos nossos analistas, a estratégia de Bismarck era nas quatro colônias do império alemão, através da educação, destruir os outros colonialistas e provocar a luta pela liberdade e unidade...



Sim, há responsabilidade ética e moral nos naufrágios no Mediterrâneo e o último rinoceronte branco?

No livro Ecofascismo, Jorge Orduna registra o número de baleias caçadas no Atlântico sul e os ingleses tomaram as Ilhas Malvinas, pois necessitavam de um porto (Stanley) para o apoio logístico, depósito e comércio de licenças e serviços. Lá está o registro de quantos milhares foram mortas a cada ano até ficar antieconômico e se substituir o óleo de baleia pelo gás de petróleo e eletricidade...

Para militares, estratégia é a ciência e arte, já tática é sua aplicação; Da mesma forma, ética é equivalente à estratégia e moral é sua prática entre os povos.

Ontem, na TV, percebi que “militante/torcedor” é um fanático, sem estratégia ou tática, ou seja, sem ética ou moral seja ele azul, vermelho ou verde.

Um norte-americano, dono de um canal de televisão à cabo, em Lüderitz, capital da Namíbia, tentou subornar um funcionário de hotel com cem dólares, mas recebeu a resposta cortês: “Isso, aqui não funciona, infelizmente o senhor não tem reserva”. Outro visitante estrangeiro, do alto de sua ignorância, afirmou em discurso: “A cidade é tão limpa que nem parece que estamos na África”. Finalmente, alcancei entender o porquê do fracasso do Receituário Agronômico e maior consumidor de agrotóxicos do mundo, da concentração da terra & Reforma Agrária ou atraso e sobre preço nas obras públicas e privadas no Brasil.

No Baruel F.C time de várzea pude ver o ocaso do jogador da seleção Brasileira e ídolo corintiano Baltazar e torcer ao lado do padre e seus pais depois da missa...

Os lemas da Tanzânia são uhuru na umoja, que em swahili significa liberdade e unidade África...) e furaha maadhimisho ya miaka (Feliz aniversário).

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*Engenheiro agrônomo e florestal, ambientalista e escritor




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