Os anos 90 me marcaram por vários motivos. Eram tempos de vivências intensas em diferentes dimensões da minha vida – financeira, sexual, profissional, política e acadêmica. Após certo desencanto no curso de história e uma completa decepção com a economia nos primeiros anos daquela década, ingressava no jornalismo por volta de 1996. Mas ainda nos primeiros anos dos anos 90 tive constantes mudanças de residência, de trabalho e de perspectiva ideológica (vermelhadamente falando). É interessante perceber como os acontecimentos históricos incidem sobre os seres humanos em cada momento. A velha questão Indivíduo X Sociedade. Era ainda a fase do primeiro governo Collor, seu posterior impeachment, assume Itamar, e depois, Fernando Henrique. Eu, então, residia em uma pensão cabeça de porco da Cristóvão Colombo, pleno coração da decadência de uma capital em crescimento. A “era petista” ainda era de ouro, e eu lutava para sobreviver entre empregos sobrevivíveis para um acadêmico de universidade pública. E do campo para cidade, pesava o MST em sua causa com grande ressonância no País. Com os governos de FHC, a grande sede de mudança que sacudia o País, apenas se inflamou mais. Nesse período, a propósito da questão agrária, lembro que visitei uma exposição que me marcou muito no museu da Ufrgs, foi o ensaio de tripla linguagem Terra. Sebastião Salgado, Chico Buarque e José Saramago combinaram seus talentos em um só foco, e o resultado foi encantador. As imagens de crianças brincando com ossinhos de animais mortos na seca do sertão nordestino, com a poesia de Saramago e a música de Chico ao fundo, sobre o mesmo tema, nunca saíram de minha cabeça. E nesse entrevero, poucos anos depois, o Pará experimentou o Massacre de Carajás. O governo do estado era do tucano Almir Gabriel. Em Porto Alegre, lembro que Tarso Genro, então prefeito, estendeu uma enorme faixa preta sobre a prefeitura em luto pelos 19 mortos. Poucos anos antes, em 1991, protagonizei ainda mais de perto a repressão da Praça da Matriz, que resultou em um soldado morto e dezenas de colonos feridos (o caso rendeu um livro, e no calor da hora, um jornal exclusivo de fotos – produzido pelo Sindicado dos Jornalistas do RS – em protesto contra as distorções do fato na imprensa grande). Pois bem, estamos há 16 anos de Carajás e pouco mudou nessa mesma imprensa a respeito de reforma agrária. Ilusão pensar na possibilidade de pluralidade, em um cenário em que os empresários da comunicação são também, em sua maioria, agropecuaristas latifundiários ou, de qualquer modo, plenamente identificados com esse segmento, em detrimento da pequena propriedade ou dos assentados. Então, resta-nos entender, cultivar e manter viva a chama de Carajás. Porque Reforma Agrária ainda é uma questão de primeira ordem, e precisa pautar a agenda política nacional. Até que se concretize de fato.
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