
Não é difícil
compreender, contudo, o que pretendia Dilma ao aceitar fazer parte da noite de
gala da família Frias. Terminada a Era Lula, a presidenta se viu na
contingência de criar uma rede própria de relações na mídia, com quem imaginou
ser possível firmar um acordo de civilidade. Lula, a seu tempo, também caiu
nessa esparrela. Mas nem a experiência do governo anterior, nem as baixarias
encampadas pela mídia na campanha de 2010, ao que parece, foram capazes de
convencer Dilma da inutilidade desse movimento.
A mídia que aí
está, protegida pelas cidadelas dos oligopólios e por uma adestrada bancada
parlamentar de vários níveis, nunca irá se conciliar com um governo de cores
populares, de ligações esquerdistas, mesmo esse esquerdismo envergonhado do PT.
Essa mídia tem como única agenda a defesa do grande capital, do latifúndio e do
liberalismo econômico predatório regulado pelas forças do mercado. É uma mídia
constrangedoramente provinciana, mas absolutamente descolada da realidade
brasileira, ignorante da força dos movimentos sociais e nutrida, cada vez mais,
por jornalistas pinçados da mesma classe média que acostumou a paralisar pelo
medo. E, em muitos casos, por experientes jornalistas cooptados pela
perspectiva de visibilidade e uma aposentadoria tranquila, às favas com os
escrúpulos, pois.
Dilma, por sua
vez, protege-se dessa discussão por trás do escudo da “gerentona”, da
presidenta voltada para a administração da infraestrutura e da saúde econômica
do país. Pouca ou nenhuma atenção dá ao alvoroço golpista diuturnamente
organizado, ainda que no modelo cucaracha mais do que manjado aqui consolidado
no esqueminha Veja-Jornal Nacional-Folha-Estadão-Globo, com o suporte diário
dos suspeitos de sempre plantados nas trocentas colunas de opinião a serviço do
pensamento único ditado pela direita brasileira.
Foi preciso um
tapa na cara dado, vejam vocês, pelo gentil Fernando Henrique Cardoso para
Dilma Rousseff, enfim, esboçar uma reação – e, possivelmente, entender o que
está se passando no país que existe além da calçada do Palácio do Planalto e
das planilhas sobre evolução da base monetária. Resgatado temporariamente do
esquecimento, FHC foi alçado ao patamar de boneco de ventríloquo para falar o
que nem mesmo a mídia, em toda sua fúria conservadora, tinha tido coragem até
então de por em palavras: Dilma seria vítima de uma “herança pesada” de Lula.
Isso vindo de um
presidente que quebrou o país três vezes, submeteu a nação ao FMI, permitiu um
apagão energético, foi reeleito graças à compra de votos no Congresso e deixou
o cargo com a popularidade no rodapé.
Expor FHC ao
ridículo e, ao mesmo tempo, incensá-lo com longos textos laudatórios faz parte
de um paradoxo recorrente na imprensa brasileira, também descolada cada vez
mais de um artigo de luxo: o jornalismo. A capa da Veja com Marcos Valério de
Souza, vermelho como um pobre diabo, a acusar Lula é mais um movimento
desesperado para interditar o ex-presidente, justamente quando ele trabalha
para eleger candidatos do PT Brasil afora. O texto, baseado em frases
atribuídas a Valério, ainda que viesse mesmo da boca do publicitário mineiro, é
parte de mais um rito dessa polca golpista entoada por uma estrutura de
comunicação viciada e moribunda.
O mais curioso,
no entanto, é a revelação feita pela Folha de S.Paulo sobre os gastos oficiais
de publicidade federal com essa mídia tão liberal e amante da livre iniciativa:
as Organizações Globo ficam com um terço de todo o dinheiro do tesouro nacional
disponível para propaganda; as dez maiores empresas do ramo, com 70%. Ou seja,
são financiados para fazer panfletagem política de quinta categoria.
Sem essas tetas
generosas do governo ao qual achincalham por encomenda, todas essas portentosas
instituições da imprensa nacional e seus zelosos colunistas, estes, lacrimosos
paladinos da liberdade da expressão e do livre mercado, iriam à bancarrota.
Todas, sem exceção.
Na semana
passada, Dilma cancelou de última hora a presença em um evento da revista
Exame, a quinzenal de economia da Editora Abril, em São Paulo. Alegou “motivos
familiares”, mas já havia sido avisada da patranha da Veja. Mandou o ministro Guido
Mantega, da Fazenda, em seu lugar. No meio do evento, Mantega se levantou e foi
embora. No mesmo dia, instigada pelos donos, a cachorrada hidrofóbica instalada
no esgoto da blogosfera se autoflagelou, histérica.
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