Domingo chuvoso durante todo dia, dia de visitar a família e encontrar notícias pouco alentadoras. Meu pai anda com problemas de saúde, colheita de quase uma vida inteira de álcool, fumo e outros desleixos com a saúde. O tempo passou e, agora, apenas sobra para cuidar dele minha mãe, como ele, também na faixa dos 70. Perturbação, obviamente, para todos os filhos. Mas é parte da vida. O envelhecimento chega para todos e, como se diz, com ele todos nós nos tornamos um pouco crianças. Precisamos de alguém que nos apoie nessas fragilidades naturais. A proximidade da morte que o envelhecimento traz, por outro lado, também intensifica nossos pensamentos e sentimentos sobre a vida e sobre o valor das pessoas que nos cercam. É fato que ninguém é anjo, e nem nisso se transforma por estar debilitado de saúde. Mas, como humanos, sentimos naquilo que a pessoa afeta significou positivamente. E é impossível alguém nada ter de positivo. Os lugares que vivemos e os momentos que estivemos com pessoas que representaram algo para nós ficam relacionados na memória em sentimento único e individual. O incêndio no Mercado Público ontem à noite, por exemplo, trouxe-me uma série de lembranças sobre momentos que vivi naquele local.
Ontem, uma fagulha de tristeza foi sentida no coração dos gaúchos que transitam diariamente, ou transitaram eventualmente, pelo coração da cidade. Um incêndio, ainda de causas desconhecidas, destruiu o Mercado Público de Porto Alegre, um dos símbolos mais importantes da cidade. Ali, a vida circulava em toda a sua diversidade. Mesmo um pouco mais refinado, a partir das últimas reformas, seu interior ou arredores abrigava pessoas de todas as classes. Seu cheiro de peixe, nem sempre agradável para alguns, era a marca típica de uma rusticidade, que costumava nos transportar para um outro lugar, distante do barulho e da sordidez da vida urbana. Um verdadeiro abrigo ao coração em contraste com a vida maquínica que a invasão dos motores, das grades e dos asfaltos dominaram nesses tempos chamados modernos. No mercado público conheci ou reencontrei diversas pessoas que marcaram e ainda marcam minha vida. Por sua localização geográfica estratégica, era um ponto de encontro privilegiado para todas as direções da cidade, além de um cartão postal belo do Centro. Com esse incêndio, a cidade está simplesmente de luto. Eu, de minha parte, ainda não posso imaginar o Centro sem aquele prédio amarelo de arquitetura tradicional que por tantas décadas foi o símbolo da vida de tantos gaúchos. Amanheceu chuvendo, infelizmente, a chuva não chegou a tempo para ajudar a apagar as chamas. Mas ela traz uma espécie de lamento em um dia triste que foi embora. Os pingos de chuva que caem nesta manhã de domingo são como as lágrimas dos gaúchos que um dia transitaram, riram, refletiram ou simplesmente viveram encontros e momentos felizes no interior ou arredores do Mercado Público de Porto Alegre. Que venha um novo Mercado Público, projetado e construído o mais próximo possível do que se foi, ainda que nunca igual. É o que todos desejam.
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