quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Bom Fim, vários começos


Filme sobre um Bom Fim é um documentário, no sentido literal, ao mesmo tempo que também transcende convenções estéticas. É uma riqueza nesse trabalho de Boca Migotto a síntese construída da miscelânea de olhares de figuras emblemáticas na história desse bairro referencial p/ gerações porto-alegrenses. Mas vai além. É também uma história intertextual. A música, o teatro, o cinema, o comportamento urbano que marcaram momentos de muitas vidas, em um tempo comum, vão se revelando, singular e pluralmente, no avesso de sua própria criação, em conexões de uma grande memória coletiva. Transitando por pessoas tão próximas - de diferentes segmentos artísticos - na identificação com um mesmo pólo difusor (ou seria transformador?), poderia facilmente descambar no bairrismo, que é um vício de uma certa orientação cultural regional, mas, felizmente, escapa disso. A liberdade de opiniões, permitida nas entrevistas, aliada à uma diversidade larga de fontes, que olham por vários ângulos esse caldeirão urbano, oferece ao espectador a possibilidade de um riso crítico, quando a sí se enxerga, e, acredito, uma saudade do que não viveu, quando descobre esse universo como um outsider. Há, portanto, o clima para uma simbiose entre a tela e o público, que se enxerga ou se confunde entre as várias caras e memórias que já circularam, e que ainda circulam, por aquele trecho efervescente da Avenida Osvaldo Aranha e seus arredores. O valor simbólico maior desse documentário está, assim, na teia discursiva que articula com essas vozes, de distintos momentos, mas que falam de uma mesma experiência cultural. Uma comunidade de sentidos que se faz mais presente na medida que se apagam seus rastros.


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