Sebastião Pinheiro*
O cientista Roberto da Mata, em entrevista à TV, afirmou que
foi criança, em uma casa sem livros. Minha situação era pior, fiquei órfão
muito cedo e forçado a “não chorar por não ter sapatos, pois haviam aqueles que
não tinham o pé”. O primeiro nome do país independente foi “Império” do Brasil.
Na casa onde morava ninguém era alfabetizado, pois escola era para a elite,
logo, mesmo indo à escola, livro era supérfluo.
Aprendi a ler sozinho, antes dos 5 anos com outros primos
que iam a escola. E, além do jornal O Dia, lia, emprestada pelo vizinho
livreiro, as Seleções Reader’s Digest velhas que ele colecionava.
Ler e escrever é muito bom, mas lembro que tomei uma coça
aos 11 anos por contestar meu tio, que rato velho não virava morcego, pois são
espécies diferentes; Outro “tio” (as aspas, pois ele era casado com minha tia)
me deu outra coça, pois ele disse “Orospoque”, para o helicóptero, e eu cai na
asneira de corrigi-lo.
Hoje, a segurança que a leitura dá a TV retira, pois esconde
a realidade ao não permitir a reflexão que ela traduz.
Meu assunto é a Convenção Republicana, seu início com os
protestos generalizados, que me fez assistir os quatro dias, alternando CNN e
FOX no show pirotécnico, algo difícil de digerir pelo pouco educativo, meus
tios adorariam.
O bizarro eram as prédicas diárias de pastores religiosos
que levavam os convencionais ao transe hipnótico. Discursos sem conteúdo ou
qualidade, apenas fé partidária dos não contrafeitos a candidatura de Donald
Trump. Foi uma avant premiére sobre a decadência do perigoso Império, que
jamais ostentou este nome e para entender o melhor é ler Negri ou Lichtheim.
À frente da TV, recordei o canastrão Collor copiando os
passos de Jânio Quadros, mas sob o “script” da Plim-Plim, como “caçador de
marajás”, que teve até mesmo um Globo Repórter Especial para o prefeito nomeado
de Maceió poder eleger-se governador. A leitura de permite reconhecer o coxo
(rengo) sentado e o cego dormido.
Lembrei na época em que estávamos ultimando a constituição,
quando o tresloucado desempregado Raimundo Nonato Alves da Conceição seqüestrou
o avião da VASP no vôo 375, de 28 de setembro de 1988, e queria jogá-lo contra
o Palácio do Planalto. Assassinou o co-piloto e baleou o engenheiro de vôo. Ele
foi abatido por três tiros, mas morreu no hospital por “anemia falciforme”, uma
anomalia genética sem nenhuma relação com os tiros dos “snypers”, conforme
consta na Wikipédia, o laudo foi assinado pelo famoso legista Badan Palhares,
que também atuou no assassinato e suicídio do PC Farias e namorada,
contraditado por peritos de renome.
Sim, é da nossa índole o riso fácil, irresponsável, a
pândega, galhofa ou troça herança da corte para o comportamento do povo.
Voltemos a Trump, os analistas yankees disseram, que o pior
não é a eleição de Trump, mas o “trumpismo” como herança política na periferia
do mundo. É isso que o Erdogan está fazendo? As corporações estimulam. Os
analistas políticos yankees sabem que tudo lá já foi programado com
antecedência de 50 anos no mínimo, bem diferente do que passa nas universidades
periféricas caudatárias.
É razoável lembrar o “caçador de marajá” já governador de
Alagoas, quando o Brasil conheceu uma tentativa de “11 de Setembro”, 23 anos
antes e teria conhecido seu “Trump” também 27 anos antes, não fosse a
intervenção do ex-presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha ter descoberto um
erro na filiação do apresentador Silvio Santos ao PMB que fez a justiça
eleitoral impedir sua postulação (foto).
Em três dias de propaganda partidária ele superava o Collor
e seria o Berlusconi caboclo, mas foi indeferido.
Antes de a convenção republicana começar os golpes e
atentados já somavam quase mil mortos e o dobro de severamente feridos em menos
de dez dias. Durante ela o tiro policial ao afro americano foi respondido por
veteranos com o tiro ao policial. Não sai nos jornais o altíssimo índice de
suicídios de veteranos do Iraque, Afeganistão, mas garanto que preocupa a ação
dos dois veteranos. Será que eles aprenderam algo na cultura do Oriente Médio
que despertou neles a reação? Qual o risco disto se alastrar como em 1968... A
impressa não pode publicar o que está fora da pauta ou do script. Eis a
liberdade.
A convenção terminou com mais duas situações esdrúxulas
antes do sangrento atentado em Kabul; Os tresloucados 9 assassinatos em
Munique; E no Brasil houve dez prisões de terroristas”... Desinformado, eu
pensei que era a galhofa típica contra a corte e já começava a listar: Zika,
Chikungunya, Caxumba, Dengue, Delação premiada, Preço do Feijão, Preço do
Leite, Fila no Aeroporto, Gabinete do Senador, Água de Porto Alegre. Mas a
coletiva de imprensa do Ministro da Justiça me intranqüilizou.
Foi o taxista quem me trouxe a tranqüilidade de volta com
seu forte acento carioca: “O Dr. lembra a Greve na Siderúrgica Nacional, houve
3 mortos. Mas foram eleitos mais de vinte prefeitos nas eleições municipais e
pelo menos 3 governadores no ano seguinte...” Eu não entendi e ele continuou:
Esses presos da “Hashtag”, já começam a carreira política e quiçá algum possa
chegar ao píncaro e soltou uma risadinhas sarcástica similar à do pica-pau rei
da Mata Atlântica.
Ainda atônito, ao pagar a corrida, atrevi a perguntar-lhe: O
Sr. lê muito, não é? - Sim, foi a única coisa que herdei de minha mãe, que me
obrigava a ler todo o dia e escrever 30 linhas sobre temas que ela criava.
Voltei para casa e entendi a convenção republicana: O que
aconteceu na Bósnia e Kosovo não foi só um problema racial, nem intolerância
religiosa. Tanto o Império, quanto as corporações não permitem existir uma fé (igreja)
descentralizada; nem meios de comunicação ou escolas fora do script, por isso
tanta língua de aluguel diz bobagem sobre escola e ideologia sem ler os 14
livros de Paulo Freire, um advogado desiludido, que se tornou o maior educador
do Século.
Se Trump ganha ou não é de menos, mas Ted Cruz seguramente
será o César seguinte ao próximo. O resto é outro carnaval, como dizia o vô
Nono.
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*Enhenheiro agrônomo e florestal, ambientalista e escritor
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