A literatura, como a arte em geral, tem sua perenidade na linguagem universal profunda com que são retratadas certas obras, e isso faz toda a diferença entre um trabalho que modifica olhares e um mero produto da/para indústria cultural. É o que se vê em Cyrano Fernandez (Alberto Arvelo, Venezuela, 2007). Essa produção latino-americana é uma versão da obra francesa Cyrano de Bergerac, que narra a saga de um militar, pensador e escritor parisiense do século XVII, e que tornou-se um clássico, transposto para a literatura e o cinema por autores de vários Países. A habilidade com as palavras e com a espada (no caso latino, a pistola) é uma dupla qualidade de Cyrano, que contrasta com sua aparência rude, que não seduz sua prima, Roxele (Jessica Grau). Esta, guarda seu amor para Cristian (Pastor Oviedo), o terceiro personagem desse triângulo romântico; nele, Cyrano é cercado pela contingência de assumir o papel de redator das cartas de amor do homem que corteja a mulher que ele ama, mas que sequer imagina a intensidade de seu sentimento. Em meio ao submundo violento do narcotráfico, na periferia de Caracas, Arvelo trabalha com sutileza dos extremos da gangorra da existência, que povoam todos nós: Beleza e Estranheza; Morte e Amor; Violência e Ternura, etc. O ator Edgar Ramirez, nesse aspecto, interpreta com maestria tais bipolaridades. Nesses tempos de caricaturas políticas e tragédias sociais, é sempre revigorante ver um registro épico adaptado às possibilidades dramáticas que a vida na cidade alcançou, tanto para o bem quanto para o mal.
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