Sebastião Pinheiro*
"O período é de festas religiosas para muitos e
passagem no registro do tempo para todos. Convida à reflexão, felicitações,
perdão e, principalmente, esperança no futuro, mas entornou o caldo, chutei o
balde. Não dá mais para aguentar, mesmo para um pacifista e equilibrado. Tudo
tem limite, a violência está demais.
Toda manhã leio o UOL, e disciplinadamente aprecio os
comentários nas matérias da F de SP, para sentir como andam as coisas pelo
externar de opiniões. Não há adjetivo suficiente para o grau de intolerância
–desfaçatez - ignorância estampados nos comentários, na grande maioria de
“leitores” do meio de comunicação mais festejado do país.
Por que todo esse
ódio? O que está acontecendo? Será a resposta instantânea, explosiva, sem
discernimento ou reflexão da mídia eletrônica? Não sejam ingênuos, não pensem
que as pessoas não sabem mais contar até dez. Tudo é muito bem calculado e os
comentários permitem organizar a gestão social do rebanho: Público, Privado e
outros, através de análises estatísticas simples com amostras estratificadas em
universos seletivos no interesse do “poder” impondo interesses financeiros
atendendo ao poder imperial e seus cônsules. Na periferia, antigamente havia a
escassez e até ausência do Estado para o exercício da cidadania por todos.
Algo
que hoje está tão central, que são poucos os Estados Nacionais que resistem,
ainda por algum tempo, pois tudo é alcançado não mais por políticas públicas e
educação, mas agora somente permitido através do comércio no mercado e
unicamente para consumo.
Para esse poder é melhor alcançar toda e qualquer
transformação por meio de suborno, prostituição, corrupção do que através de
educação, saneamento, infraestrutura, pois toda lei, norma, regra é um
instrumento educacional que esbarra em resistência étnica, cultural,
idiossincrática e religiosa, que retardam os objetivos desejados e premeditados
pelo poder que deseja ser único e imperial. Eis alguns exemplos:
1) Na primeira vez que ouvi falar do vírus Zika na TV
nacional há aproximadamente um ano, a autoridade sanitária federal dizia que
não era para preocupar-se que eram manchinhas na pele e uma coceirinha que em
15 dias desapareciam. Ninguém cobra do canalha inconsequente e incompetente que
deu um sinal de tranquilidade, quando já dois anos antes na Polinésia Francesa
uma deputada anunciava que mais de 40 mil pessoas tinham sido infectadas com
diversas e severas sequelas. Hoje há um estranho ufanismo com a “descoberta” da
microcefalia, mas não se tempera o seu significado macabro. Em 1900, Oswaldo
Cruz desinfetou a cidade do Rio de Janeiro e exterminou a Febre Amarela urbana
e o mosquito da dengue sem as tecnologias que dispomos hoje, pela ação
sanitarista (franco germânica). Há 40 anos um estudante de agronomia em
Seropédica a 42 Km do Rio de Janeiro identificou larvas do mosquito da dengue e
levou para a Universidade Rural.
O que foi feito por parte do Estado?
O
“Fumacê” passou a ser cantado em prosa, verso e troça sem parar a expansão do
mosquito ligada as más condições de saneamento básico. É que Oswaldo Cruz
eliminou as causas através de saneamento e o fumacê combate os efeitos. Verbi
gratia seu contencioso com a elite do Colégio Militar do Realengo, que não era
somente pela vacinação. Hoje ele é endêmico assim como a Febre Amarela voltou a
urbanizar-se em zona de turismo internacional, pois o negócio é consumir veneno
e não privilegiar o saneamento básico e estratégico. Há denuncias que o recurso
para comprar o veneno de controle foi desviado para campanha política. Porta
arrombada, o “Plim Plim” passou a recomendar que o mosquito não pode nascer,
como se o crime fosse da natureza e não da ação humana inepta. Estranho, onde
chove a cada quinze dias é possível ter eficiência que uma endemia requer, sem
a educação de um padrão industrial ou pós-industrial? Por que será que a escola
do Dr. Oswaldo não vingou no Brasil, América Latina e Africa?
2) A merenda escolar é bandeira de salvação da infância na
escola (pública) e tem gente altruísta com alteridade intelectual, que afirma
ser a solução social, pois é a única refeição de muitas crianças. Desvirtuando
que escola é lugar de aprender e não de comer, logo algo está errado antes da
escola; “Pública” está entre parênteses, pois o significado de público é para
todos, o que não acontece na grande maioria dos países e menos ainda no nosso,
onde os governantes pensam que estão concedendo alforria e não um direito
pétreo cidadão. O duro é escutar a idiotice que diz estamos a cada dia melhor
jogando o a solução para as calendas gregas. A questão é clara, um famélico não
aprende, mas qual é o aprendizado de alguém depois de comer a única refeição?
Isso é mais uma tortura fisiológica que docência; Nesse contexto, a propaganda
de merenda escolar orgânica é indecente.
3) Quanto à saúde, o pobre SUS está transformado em
distribuição de medicamentos (contrariando às empresas de comunicação com
interesses nas participações e previdência privada) e não há fomento à saúde
através do saneamento, nutrição e prevenção total. Todos hospitais foram
transformados em Pronto Socorre para onde acorre levas de desesperados por
vontade própria, sem os protocolos de triagem hierárquicos de atendimento
eficiente como em todos os países onde o Estado existia, e agora resiste ao
comercio de saúde. O termo “cirurgia eletiva” permite entender o desmazelo e
negócio que endivida os sistemas previdenciários. Há 50 anos somos o maior
consumidor de cesarianas do mundo, embora sejamos esculturalmente reconhecidos
pelos “ilíacos e sacro” (glúteos). Sim minha gente somos pentaicosacampeão nos
negócios das cesarianas;
4) Milhões de dólares são gastos por agentes de propaganda
política oficial em Campanhas Permanentes contra agrotóxicos/transgênicos,
enquanto eles batem todos os recordes mundiais de consumo sem que possa haver
fiscalização, controle e educação para o agricultor, custando o tratamento das
intoxicações uma parcela significativa nos gastos em saúde pública, pois é
lucrativo para uma burocracia que se locupleta através de coimas e disfarça a
inoperância e subjugo aos interesses corporativos internacionais.
Estes quatro exemplos se consolidam em um só: VIOLENCIA
IDEOLÓGICA. Ela, hoje é o vetor principal do poder, mas nunca apresentada como
tal e quando ocorre sua clarividência, muitas vezes atinge o alvo errado. O
exemplo pode parecer hilário, mas é trágico sem ser macabro. Em 1959 os
revolucionários cubanos proibiram o uso do saxofone acreditando ser ele um
símbolo norte-americano, mas esse instrumento musical do século XVIII é de
origem belga, embora muito executado nos ritmos ianques nos Cabarés e Cassinos da
ilha de lavagem de dinheiro.
A violência de sua proibição sequer abriu uma fresta nas
reflexões e comportamentos revolucionárias durante um bom tempo pela falta de
ambiente para contradizer a ignorância e ódio. É dramático quando o passado e
memória não ensinam, o que é mais facilmente notado nas periferias, onde o ódio
é mais explosivo e mortal pela carência de escola e ambiente social. No Brasil
algo ocorreu com a capoeira, principalmente na Bahia e Rio de Janeiro.
Fico chocado quando amigos chamam minhas observações de
sarcásticas ou irônicas, pois o que para eles é violência para mim fica em
plano inferior. Ao mesmo tempo em que o quem eu considero violência eles
ignoram. É necessário desmistificar este engano dissecando a violência como
vetor, meio, direção, sentido e fim do que o jornalista (filósofo) mexicano
Javier Esteinou Madrid chamou de “Estado Híbrido do Século XXI” e nós nos
atrevemos a antever como uma estação à Eugenia, preparatória do Estado
Totalitário Mundial.
O francês Alexis Carrel, Prêmio Nobel de Medicina em 1912 e
bolsista da Fundação Rockefeller no último capítulo de seu livro: “O homem este
desconhecido” de 1935 aborda a necessidade da Eugenia. Ela foi amplamente
aplicada como política social de saúde pública na Europa, América do Norte e
teve até mesmo seguidores na América Latina e Brasil no início do Século 20,
mas o Estado Nacional atrapalhava seu êxito. Agora, o Estado Transitório
permite perceber o amadurecimento do mercado e por si só tem condições de
alcançar os objetivos de forma lucrativa.
- Há 20 anos os agricultores franceses (paysans =
camponeses) foram às cidades, estradas e enfrentamentos contra o Agrobusiness
(PAC) por direitos, antevendo as ameaças eugenistas contra seu biopoder;
- Nos EUA nos últimos 10 anos mais afrodescendentes foram
assassinados pela polícia norte-americana que nas décadas anteriores. Logo é
violência estrutural, sistêmica.
- A roubalheira de dinheiro público e privado (FIFA) antes
permitida pela necessidade hegemônica na bilateralidade, agora é reprimida pela
violência ideológica do sistema financeiro imperial;
- A violência cretina de criminosos “pés de chinelo” ou
“paramilitares” e terroristas, é apresentada na TV com cenas escatológicas,
como ação religiosa, insultando nossa inteligência. Da mesma forma as das
Cruzadas dos séculos IX a XI não são apresentados como uma blasfêmia ou o
sistema de torturas da Igreja (Inquisição) não fosse uma obra religiosa. O
poder exerce o monopólio da violência ideológica e a distribui na educação como
propagandda;
- A cena na TV do fecho à caçada ao ex-aliado e terrorista
Bin Laden acompanhada desde a Casa Branca, comemorado com vivas e aplausos de
forma macabra e insana. Ou o ataque de “drones” a uma residência e morte 30
pessoas para matar um revoltado criminoso inglês, até o apelido dado tem
conotação política (Jihad John). É primário que o Estado e Governo não permitem
comportamento pessoal pelo respeito à todos. Toda democracia se divide em três
poderes e um deles não pode usar de violência para substituir os outros, pois
isso é ditadura. O atentado em Paris foi realizado pelos mesmos rebeldes
psicopatas franceses e belgas. Uma resposta esperada que permite e respalda o
uso de mais violência para a construção do amanhã eugenista totalitário;
- O Estado de Israel indica como seu embaixador um eugenista
(organizador da expulsão e colonização de propriedades palestinas) e os meios
de comunicação não sabem ou não podem ler a agressão violenta, que expõe a
inépcia governamental sem que a cidadania tome conhecimento e participe da
discussão, embora os lemas sejam “Pátria Educadora” e “Brasil de Todos”. Somos
um dos países onde as duas comunidades convivem, compartilham e se respeitam
lado a lado sem qualquer problema integrados à nação. Isso para a ideologia
imperial é subversão: Não pode haver paz ou concórdia, usa-se todo tipo de
violência para criar ódio e negócios rentáveis.
Permitam-me a comparação da indicação do embaixador com a
transformação pelo exército japonês na Coreia entre 1910 e 1945 de 200 mil
mulheres em prostitutas. O reconhecimento do crime, o pagamento pecuniário não
é indulgencia que abole a violência e culpa.
Os quatro exemplos anteriores e as minhas violências
dissecadas trazem as mesmas cores dos cavalos apocalípticos e seu significado
conforme o quadro de V. Vanestsov (1887) (foto) pelo que a “Jolie Rouge” da
Juquira Candiru chora sangue, mas não arrefece no combate ideológico: Feliz Ano
Novo."
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*Engenheiro Agrônomo e Florestal, Ambientalista e Escritor