quinta-feira, 7 de setembro de 2017

ESPELHOS MÁGICOS




Há salvadores da água, do fogo e dos vírus. E há também alguns tipos anônimos, que salvam da violência urbana. Pelo mar das periferias ser bem hostil e complexo, para mergulhar nele é preciso ir mais fundo que o corpo: no contexto e na alma. Adalberto P Alegre, experiente navegador nesse oceano, escolheu a imagem como ferramenta para atuar sobre as cabeças de jovens de famílias em situação de de alta vulnerabilidade. Tem feito isso há décadas, e com prazer. Com um histórico de pai de quatro filhos, guarda-municipal, sindicalista, instrutor de serigrafia nas periferias de Porto Alegre, professor de história e de artes visuais, Adalba não se aquieta na base: pesquisa, cria, adapta e transita entre o teórico e a realidade crua; entre a academia e o barraco. Telas, pinhole, celular, produtos e suportes alternativos, vale tudo, tudo é meio. Suas oficinas de fotografia aplicada ao ensino, paralelas ao trabalho na escola, atraem professores, pesquisadores e profissionais de arte, do sul ao norte. Mas não perde o foco. "Íamos em cada casa, levávamos um café e conhecíamos, por dentro, a realidade daquelas crianças, e dali, transformei profundamente o meu olhar como professor; dizia aos meus colegas: o mau-cheiro de alguns deles é muito mais do que uma questão de água e luz, é condição, é autoestima, é esperança. Precisamos descer muito, com humildade e respeito, antes de diagnosticar o que nos é estranho", falava-me ontem, em um agradável café de lembranças e vivências, que tivemos em seu ateliê, no último andar de um prédio discreto, no Centro de Porto Alegre. "Salvamos muitas vidas, e tenho orgulho disso", comenta, sem nenhuma arrogância. Em poucas horas, viajamos no tempo e no espaço - educação, morte, política, fotografia, cinema, e claro, boas lembranças das nosso passado-presente comum na Casa do Estudante da Ufrgs. Risos às lágrimas. Essas voos curtos com pessoas raras sempre nos renovam.

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