quinta-feira, 31 de maio de 2012

Picadinhos da semana

A escritora Margarida Botelho durante
oficina para professores em Canoas (RS)
Ando com atenção ao meu tempo, para me dedicar mais a coisas que realmente gosto. Há porções do tempo que dispomos em nosso dia, que não tem jeito de modificar. Mas outras, optamos. Durante a oficina da escritora Margarida Botelho ontem, achei interessantíssimo sua exposição sobre a experiência em arte-educação em um campo de refugiados da África, onde percebeu um tempo diferente. E observou que o tempo do presente é o maior que dispomos, porque é concreto e praticável.
*Lamentável a nota que leio no Mídia Independente sobre a discriminação social no Distrito Federal,  que levou esse site a uma Nota de Repúdio à Patologização e à Exclusão de Travestis e Transexuais.
*Nesse fim de semana vou imergir no turbilhão da segunda feira do livro do RS. Um trabalho que dá prazer em vários aspectos, visto que combina a minha atividade jornalística com o prazer de descobrir pessoas e aprender com novas ideias.

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Para sempre África

A origem do que somos, da nossa selvageria à nossa condição de mais humanamente avançado, pode ser melhor despertado ou percebido a partir da Àfrica. Temos muito que aprender por lá. Vale a pena ver toda a série, apresentada pela Aline Midlej. O material foi buscado no Vi o Mundo.


terça-feira, 29 de maio de 2012

A Orla é nossa, sim, é de todos

Foto do PortoImagem ilustrando a privatização
progressiva  da orla do Guaíba
Esse movimento em Porto Alegre contra a privatização da orla do Guaíba, que estou me inteirando aos poucos, é altamente necessário. A prática da privatização das orlas, que já é comum nos litorais brasileiros das praias de mar, parece que começa a se estender também aos lagos e rios. No caso do lago Guaíba, esse mistura combina a invasão por clubes de futebol, mansões, comunidades excluídas, e outros empreendimentos que possivelmente se tem em vista. A divisão da cidade do Rio, por meio do muro da Mauá, já foi um distanciamento impactante de uma das mais belas paisagens que Porto Alegre apresenta. È preciso que não se perca também mais esse bem precioso, que é  a possibilidade de acesso a por-do-sol, em ao longo de uma Margem mais longa possível. É o mínimo para uma cidade conhecida por um alto nível de politização.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Benedetti e a arte de alimentar-se dos obstáculos


Um time de peso por mais transparência no acesso ao SUS
Não lembro de ter colocado nada nesse espaço sobre a minha recente formatura em Especialista em Comunicação e Saúde. Reproduzo, então, essas belas palavras desse brilhante poeta uruguaio, dedicado pelas coordenadoras do curso aos formandos, durante solenidade ocorrida no último dia 17 desse mês.

Não te rendas...

Mario Benedetti

Não te rendas, ainda há tempo
Para voltar e começar de novo,
Aceitar as sombras,
Enterrar os medos,
Soltar o lastro,
Retomar o voo.

Não te rendas, pois a vida é
Continuar a viagem,
Perseguir os sonhos,
Destravar o tempo,
Percorrer os escombros
E desvelar o céu.

Não te rendas, por favor, não desistas,
Ainda que o frio queime,
O medo morda
E o sol se esconda,
Ainda que se cale o vento.
Ainda há lume na tua alma,
E vida nos teus sonhos.

Não te rendas
Porque a vida é tua e também o desejo
Porque o quiseste e porque te quero,
Porque existe o vinho e o amor, é claro.
Porque não há ferida que o tempo não cure.

Abrir as portas,
Livrá-las das trancas,
Abandonar as muralhas que te protegeram,
Viver a vida e aceitar o desafio,
Recuperar o riso,
Arriscar uma canção,
Baixar a guarda e estender as mãos,
Distender as asas
E tentar de novo
Celebrar a vida e retomar os céus.

Não te rendas, por favor, não desistas,
Ainda que o frio queime,
O medo morda
E o sol se esconda,
Ainda que se cale o vento.
Ainda há lume na tua alma,
E vida nos teus sonhos.
Porque cada dia é um novo começo
Porque essa é a hora e o melhor momento
Porque não estás só, porque eu te quero.









sábado, 26 de maio de 2012

Utopia e Luta: um modelo a ser seguido

Conheci hoje pela manhã a experiência da Coopsul, encravada em pleno Centro de Porto Alegre. É um modelo que de recuperação da dignidade, combinada com a construção de um modelo solidário e saudável de vida. Falo mais sobre isso oportunamente. Por hora, deixo essa matéria do Sul 21, de setembro do ano passado, sobre o tema. O blog dos caras pode ser acessado aqui.

Assentamento em prédio público desafia política habitacional

Vivian Virissimo

Localizada no centro de Porto Alegre, a Comunidade Autônoma Utopia e Luta é uma exceção à regra das ocupações urbanas brasileiras. Iniciada em 2005 com uma ocupação durante o Fórum Social Mundial, a comunidade hoje é a única cooperativa que obteve regularização fundiária pelo Programa Crédito Solidário do governo federal. “O Utopia e Luta não deveria existir. Somos o filho indesejado gerado por um acidente”, resume o músico Eduardo Solari, um dos moradores da comunidade, que poderia servir de exemplo para uma política habitacional que priorizasse a ocupação de prédios ociosos nas regiões centrais das grandes cidades.

Gerido por uma cooperativa, assentamento urbano no centro de Porto Alegre é o único do tipo financiado pela Caixa em todo o Brasil | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

O prédio, situado nas escadarias do Viaduto Otávio Rocha na avenida Borges de Medeiros, foi contemplado com o programa viabilizado pela Caixa Econômica Federal e pelo Ministério das Cidades. Propriedade do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), o edifício estava em processo de deteriorização e desocupado havia 10 anos. O projeto do Utopia e Luta é único do tipo entre os contemplados pelo programa Crédito Solidário desde 2007.
“Se não fosse um acidente, os 300 prédios ociosos do INSS, por exemplo, já teriam sido transformados em moradia popular. Se isto fosse verdadeiramente um modelo, teríamos condições de fazer milhares de assentamentos urbanos”, avalia Solari. “Eu acredito que todos estes programas foram feitos com a intenção de nada aprovar. Eles foram feitos na teoria e no papel confiando que não haveria condições dos movimentos sociais acessarem” completa.
A legislação sancionada em 2007 poderia mudar os paradigmas do direito à moradia no país. A proposta do Crédito Solidário consistia na criação de um modelo que diminuísse o déficit habitacional, viabilizando habitações populares organizadas por cooperativas, associações e entidades sem fins lucrativos. No caso do assentamento de Porto Alegre, foi criada a Cooperativa Solidária Utopia e Luta (Coopsul).
De acordo com a Secretaria de Patrimônio da União do Rio Grande do Sul (SPU-RS), uma portaria de 2008 indicou cinco imóveis para projetos de regularização fundiária e provisão habitacional para entidades do movimento social. Três imóveis em Porto Alegre – nas avenidas Protásio Alves e Azenha e na rua Silva Paes -, um em Caxias do Sul e outro em Gravataí. Destes cinco imóveis, um foi regularizado por meio do Concessão de Uso Especial para fins de Moradia (CUEM) para 17 famílias residentes na Silva Paes, individualmente, e não por meio de cooperativas. Para o imóvel da Azenha, o Utopia e Luta apresentou projeto de provisão habitacional de interesse social, mas a Justiça impediu o prosseguimento, em favor de dois idosos que residem na área. Para as outras três áreas na avenida Protásio, Caxias e Gravataí não foram apresentados projetos.

Eduardo: "Se isto fosse verdadeiramente um modelo, teríamos condições de fazer milhares de assentamentos urbanos” | Foto: Ramiro Furquim/Sul21
Pesquisadora reforça necessidade de garantir a função social de prédios ociosos
Conforme a professora de Direito da PUCRS e especialista em direito à moradia, Betânia Alfonsin, três situações compõem as estimativas sobre déficit habitacional no Brasil. “Déficit não é apenas quando a moradia não existe, também abrange a moradia precária, aquela que precisa ser substituída. A segunda situação é das pessoas que moram em coabitação com parentes. Além daqueles que pagam aluguel e gostariam de morar numa casa própria”, explica.
O cruzamento de dados oficiais do Ministério das Cidades, do Instituto de Pesquisa Aplicada e Econômica (Ipea) e da Fundação João Pinheiro estimam que o déficit habitacional no Brasil está entre 5,5 milhões e 5,8 milhões de unidades. “O Brasil têm seis milhões de imóveis ociosos entre públicos e privados, portanto poderíamos atender a função social da propriedade sem construir novas unidades”, defende a pesquisadora.
De acordo com o Estatuto das Cidades, tanto imóveis públicos quanto privados devem cumprir primeiramente a sua função social, não podendo permanecer fechados. “O Brasil reverencia muito os poderes do proprietário e não faz cumprir a função social da terra, seja rural ou urbana. Temos uma legislação avançada que ainda é aplicada de forma tímida e lenta”, analisa Betânia.
Eduardo Solari ressalta que a inexistências de outras regularizações pelo Crédito Solidário pode ser explicado pela crise imobiliária financeira que motivou o governo federal a criar o Minha Casa Minha Vida. “Com as novas políticas habitacionais, o governo passou a destinar 97% dos recursos públicos para as empresas privadas e apenas 3% entidades sociais e cooperativas”, critica.

Betania Alfonsin: "Existe um estoque de unidades vazias nos centros da cidade dotados de infraestrutura que deixam de ser usados por inércia" | Foto: Divulgação
“O programa Minha Casa Minha Vida foi articulado para combater a crise injetando muito dinheiro numa indústria com capacidade de grande geração emprego. Foi uma fórmula boa para este fim mas está longe de solucionar os déficits habitacionais, uma vez que o direito à moradia não abrange apenas a construção de quatro paredes”, concorda Betânia.
A advogada aponta que o Minha Casa Minha Vida desconsiderou o posicionamento dos militantes da reforma urbana que condenam a construção de conjuntos habitacionais em áreas afastadas da cidade. “Esse modelo foi herdado pela ditadura militar que visava deslocar os pobres dos centros das cidades e garantir apenas quatro paredes. O Utopia e Luta é um símbolo e uma experiência pioneira que garante o direito ao centro. E isto não é um favor do poder público, estes direitos estão previstos na lei”, destaca.
Para o morador do Utopia e Luta, Guilherme Schroeder, é mais barato reformar prédios públicos ociosos em bairros centrais do que criar infraestrutura em áreas afastadas das cidades. “O custo para o governo é sempre mais baixo já que as infraestrutura de água, luz, mobilidade, escolas e hospitais já está consolidada. O Estado gastaria pouco para reformar e conseguiria assentar muitas famílias. Infelizmente, a prioridade é girar a economia”, critica.
“Existem muitos interesses em jogo em função da valorização imobiliária que é gerada nesses terrenos nas periferias. Concordo plenamente com a avaliação do movimento, de que existe um estoque de unidades vazias nos centros da cidade dotados de infraestrutura que deixam de ser usados por inércia”, completa Betânia.
Utopia e Luta: uma ocupação autogestionária
A ocupação do prédio do INSS ocorreu na madrugada do dia 25 de janeiro de 2005 durante o Fórum Social Mundial em ato político organizado pelo Movimento Nacional da Luta pela Moradia (MNLM). Depois da apropriação, os moradores começaram a se articular na negociação com INSS e governo federal para garantir a regularização fundiária.
As negociações entre o movimento, Caixa Econômica, Ministério das Cidades e INSS se estenderam por quase três anos. Para garantir a reforma do prédio, a Coopsul encomendou projeto a três empreiteiras que orçaram as obras entre R$1,5 milhão e R$1,8 milhão. O crédito solidário comporta R$ 24 mil por família, valor que somado não atingiria o preço mínimo proposto pelas empresas para transformar as salas do INSS em apartamentos dignos para moradia.

Edifício tem lavanderia, espaço cultural e uma horta hidropônica comunitária no terraço | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Durante o processo com as empreiteiras, um comprador privado também iniciou negociações paralelas com o INSS. Para reverter a situação, os moradores do Utopia e Luta contataram o governo do Estado, que elaborou um documento demonstrando interesse na compra do imóvel. “Com o documento, ganhamos tempo para que a legislação 11.481, que regulamentou o Programa Crédito Solidário, fosse aprovada”, conta Eduardo.
Com o documento assinado pelo então secretário de Habitação do governo Germano Rigotto, Alcir Moreira, o movimento conseguiu pressionar para que a empreiteira baixasse os custos da obra em 50%, com custo final de R$ 719 mil. As famílias aderiram à linha de crédito que possibilitou o financiamento por 20 anos pela Caixa, com recursos do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) do Ministério das Cidades.
As 42 famílias convivem no espaço do edifício de nove andares, sendo que sete são destinados para a residência. Os outros andares oferecem lavanderia comunitária, espaço cultural, além de uma horta hidropônica comunitária no terraço do edifício – a única do país. A Cooperativa Solidária Utopia e Luta (Coopsul) também organiza oficinas de serigrafia, padaria, corte e costura no projeto “Plantando Alternativas, gerando sustentabilidade”, com recursos da Petrobras.
Cerca de 100 pessoas residem na comunidade, em apartamentos JK de 30 m² e 25 m². De forma autogestionária, se revezam em tarefas na tentativa de criar um espaço coletivo, em contraposição às formas individualizadas de convivência.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Sobre a vida além da vida, e o papo de sexta a tarde no bar

Estava ontem, em um momento informal, conversado com alguns colegas sobre essa nova tecnologia que tem permitido recolocar um artista já falecido de novo no palco. Se produz um holograma, com imagem, som e vibrações próximas do real, como se ele ali estivesse ressuscitado o artista. Foi o caso do happer norte-americano Tupac Coachella, que recentemente fez um show desse nívelnaquele País, em dueto com outro happer (Vídeo abaixo). O impactante resultado anuncia outras possibilidades. Mas, voltando ao papo, isso me encasquitou em algumas coisas com relação a essa distância cada vez mais confusae entre o real e o virtual, e me leva a algumas problematizações existenciais. Se a vida pode em tantos aspectos se eternizar por meio tantos sentidos (olfato, visão, audição...), o que é de fato a morte... o fim da vida parece cada vez mais complexo. Eu mesmo penso, intimamente, que as pessoas não morrem. Não gosto dessa palavra e nem da ideia de morte. Prefiro pensar que quem é realmente importante para nós, se dissolve no nosso ser. Já no caso das celebriddes, há um culto em seu entorno. E a maioria dos fãs de um ídolos, me atrevo a dizer, adoram mais sua imagem do que o próprio – reparo que não é o meu caso, especialmente porque me recuso a se enquadrar na condição de “fã” de alguém, mas no máximo de sua criação. Mas não isso não me impede de enxergar problematiza cada vez mais o valor da vida. Esse papo pode e deve ir mais longe. Uma boa pauta para o final da tarde de sexta, na mesa de um bar. De preferência, sem dirigir depois, porque imagens virtuais, sem corpos lúcidos, não problematizam nada, muito menos no palco.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Greves, motores e a vida coletiva nas capitais

Ao chamar os trabalhadores de "Grupelho Radical",
o governador de SP demonstra a limitação que tem
para lidar com os problemas de sua responsabilidade
Foto: Assembléia dos metroviários que decidiu
a greve - por Rede Brasil Atual
A paralisação de metrôs e ônibus, que está deixando milhões de trabalhadores a pé pelo País, indica o colapso que pode causar no sistema de transporte das capitais o cruzamento de braços dos trabalhadores nesse setor. Mesmo ameaçados e, por vezes, notificados de multas, os trabalhadores em condição de sindicalistas não titubeiam, e mantêm paralisações que prejudicaram diversas outras categorias. Descontando a crítica sobre suposta greve política, que é pálida de argumento – visto que toda ação desse nível tem que ter uma dimensão política (até os autores desse tipo de reclamação) – o impacto social e midiático dessa paralisação faz pensar em vários sentidos. Um deles dá conta que a massa trabalhadora, em que pese uma cultura tão tecnologicamente modernizada e alienada, ainda se mobiliza. É fato que tais atos prejudicaram muitos. Mas cabe questionar, que outro instrumento de luta teriam os trabalhadores do transporte, senão a greve. Por outro lado, também se nota a falta de integração entre as categorias. Se a greve integrasse também outros setores de trabalho da indústria, do comércio e dos serviços, talvez a pauta de reivindicações poderia ser melhor trabalhada para a adesão ampla e solidária aos metroviários, e não gerasse apenas incômodos amplos. E nesse caso, esvaziaria também muitas críticas corporativas da imprensa Grande. Deu para notar, por outro lado, o quanto os brasileiros de todas regiões são dependentes uniformemente desses meios de transporte coletivos. Uma professora em SP, por exemplo, declarou em reportagem que, na falta do Metrô, iria caminhar a pé por 10 Km. Não creio que as ciclovias sejam solução única como meio de transporte, mas não tenho dúvida que um sistema urbano integrando a cidade com alternativas seguras para as bicicletas é parte vital da construção de soluções radicais para o problema da mobilidade. Enfim, os aspectos são muitos, e a parte algum avanço que houve para os reivindicantes, é preciso que os trabalhadores atualizem suas estratégias e táticas, no sentido de somar para deixar marcas mais positivas e se fortalecer futuramente com o apoio do restante da população. Do contrário, vejo uma vitória muito relativa, seja ela qual for.


quarta-feira, 23 de maio de 2012

Sobre meninos e lobos

Matheus Pichonelli, Carta Capital

 

Corre na internet um vídeo produzido pela TV Bandeirantes da Bahia em que uma repórter bonita e bem humorada entrevista um jovem acusado de estupro. Chega a ser educativo – ao menos para quem achava que, a essa altura do campeonato, era impossível superar as pirotecnias de programas com o Latininho, o chupa-cabra, os testes ao vivo de DNA, a banheira do Gugu e as sessões de descarrego.
E o que a Xuxa e o jovem açoitado na Bahia têm em comum? Nada, a não ser a exposição diante de uma multidão sangrenta e incapaz de lidar com seus próprios crimes de maneira honesta. Foto: Alexandre Hamada Possi/Flickr
O mais completo tratado das relações de poder não chegaria tão longe: o jovem, cuja pobreza pode ser exposta pela sequência de dentes quebrados, está algemado diante das câmeras. Como advogado de banqueiro não defende desdentado, ninguém intercederá por ele nas páginas de jornais ou tribunas do Congresso pelo direito de não ser exposto nem antes nem depois do julgamento. Azar o dele, sorte da repórter – que usou o microfone e o canal direto com a direção do programa para chicotear o sujeito que se acreditava alforriado. Abaixo da tela a produção destaca o “chororô”, com direito a intervenções de efeitos sonoros (o choro de um bebê) a ofuscar a fala do suspeito. Acuado e com um hematoma no rosto, o jovem passa a dar a lista de familiares que poderiam testemunhar em seu favor. Às lágrimas, jura que jamais “estrupou” alguém.
A acusação, grave, então vira piada. A indignação da repórter, até então defensora da vítima, é desmanchada sem muito esforço. A justiceira posa então como defensora da língua portuguesa, com base no escracho alimentado pelo comando do programa. A mistura do jornalismo policialesco com o “método Pânico da TV” de humilhação humana dá nisso: o direito à defesa vira piada para a audiência.
Entre ela e o acusado não existe polícia, Ministério Público, Defensoria nem juiz de Direito.
Estivesse vivo, o jornalista gaúcho Apparício Torelli, o Barão de Itararé, talvez tivesse de mudar a sentença segundo a qual, para conhecer Inácio, era preciso coloca-lo num palácio. Hoje bastaria jogar um microfone em sua mão.
Não foi o primeiro nem será o último açoite no ar que o Brasil testemunha, mas vale lembrar: a tevê é uma concessão pública (talvez a capitania hereditária mais valiosa do País) e para operar é necessária a benção das autoridades. A repórter teve raros longos minutos para esticar a sessão de tortura, sem que ninguém aparentemente a detivesse. Pelo contrário: ela estava à vontade, com carta branca da direção do programa, das autoridades que regulam a programação e dos órgãos que outorgaram o direito de levar ao ar o que seu comando bem entendesse.
A repórter, de toda forma, não deveria estar constrangida: sua audiência não estava, seus chefes não estavam, seus governantes não estavam. Em outras palavras, ela só reproduziu a própria noção de justiça de um país que mal garante o direito de alguém se defender.
É o mesmo país  que hoje constrange quem se declara vítima de um abuso semelhante – ao menos se essa vítima for uma personalidade como a Xuxa. Horas após contar, em uma entrevista ao Fantástico, que sofreu abuso sexual na infância, a apresentadora virou pauta obrigatória nas rodas de conversa e meios de comunicação.
De repente, todos tinham algo a dizer sobre o depoimento: personalidades com status de formadores de opinião começavam a destrinchar o que se passava na cabeça da apresentadora. Uma socialite a chamou de doida. Outros a mandaram se queixar numa clínica, e não em público. Muitos trouxeram fatos de sua vida pessoal para deslegitimar a fala: afinal, o trauma não a impediu de namorar esportistas ricos nem de expor as pernas, dela e das paquitas, para as crianças coladas na tevê. Em suma, o mundo viu na revelação um oportunismo raro para chamar a atenção.
E onde estão esses mesmos formadores de opinião quando órgãos de defesa dos direitos humanos lançam campanhas contra a pedofilia? Em alguma palestra de auto-promoção e metalinguagem. Na vida real, foi preciso uma celebridade expor um drama pessoal para que um tema tão delicado quanto complexo viesse à tona. Um crime que tem no silêncio um terreno propício para a proliferação.
Por se tratar de uma figura pública, a revelação de Xuxa poderia encorajar vítimas do presente a quebrar o silêncio, denunciar a agressão e buscar justiça.
Mesmo assim, o esforço do público e dos formadores de opinião para transformar o episódio em piada foi notório. Era como se a repórter covarde a empunhar o microfone como chicote na tevê tivesse se multiplicado Brasil afora, desta vez para açoitar a celebridade que teve a audácia de confessar um trauma em público.
E o que a Xuxa e o jovem açoitado pela repórter na Bahia têm em comum? Nada, a não ser a exposição diante de uma multidão sangrenta e incapaz de lidar com seus próprios crimes de maneira honesta. Casos de abuso sexual existem aos montes, mas poucos tiveram a coragem de se expor e gritar para que não se repitam. Só quem passou por momentos assim sabe o quanto pesa a distância entre o silêncio e a exposição. Não parece produtivo combatê-los na base do escracho ou da hipocrisia.

Sobre morte, promessas e nosso ânimo de cada dia

Ao ver ontem um post que circula pelo Face, a partir de um guia produzido por jornalistas profissionalmente questionáveis, sobre uma suposta “desumanidade” de Che Guevara, parrei para refletir a respeito da questão do que é realmente desumano. Nós, brasileiros, de formação radicalmente cristã, temos uma forma de pensar a morte como algo calamitoso, pavoroso e inaceitável. A vida é um bem precioso – sem dúvidas – mas é reduzida ao plano individual, algo típico da classificação religiosa. Na realidade, nosso conceito de morte é muito ajustado em um plano antroprocentrico. Não digo que fujo disso, mas começo a compreeender melhor como me limita essa visão. Há pessoas que pensam e se orietam na visão de morte como um sentido maior, para além do individual. Não necessáriamente vingativo, mas inserido em um julgamento humanitário no plano coletivo. Nesse enfoque, matar é parte de um processo de existência, da construção de uma utopia que assegure uma condição de vida plena a todos. Uma situação de guerra, por exemplo, explicita bem isso. De certa forma – e aí entra bem nossa concepção antroprocêntrica – quando consumismos outras vidas para nossa sobrevivência, estamos dentro dessa lógica de guerra pela vida, pelo bem estar. Então, tendo a pensar o quanto há de cinismo nessa moral religiosa católica, que embasa a lei, sobre a morte como inadmissível. Na verdade, há coisas mais pavorosas, às vezes. O sofrimento, por exemplo. Lembro que li no Memorial da Resistência, em Mossoró, que o grupo de Lampião, durante fuga dessa cidade, matou impiedosamente um jovem que assim pediu. Este, que era espião do grupo, havia sido ferido por entrincheirados nessa cidade. Com uma bala na barriga, o garoto acompanhou o grupo, mas sangrava muito com o ferimento. E, assim, pediu para ser morto para o alíviio da dor. E assim fizeram os cangaceiros. Quer dizer, a morte, às vezes, é um caminho auto-deliberado. E quem tem o direito de negá-lo? Outras vezes (ou sempre) é um acontecimento inevitável da existência. E o que adianta lamentá-la? E ainda, em outras, é um ato ajustado a um processo utópico de dimensões maiores, um elemento tático que até contraria uma ideologia, mas, paradoxalmente pode ser etapa necessária para a construção de uma condição que assegure vida plena às maiorias. Ah, as maiorias... sempre elas. Não, não tenho opinião ainda definida sobre isso. Mas cada vez mais me convenço que pode ser muito interessante ter algo pelo que vale a pena morrer.

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Outra coisa que me perturba às vezes é a séria dificuldade que tenho de assimilar estupidez. Em geral, até posso entender ou, com o tempo, contemporizar. Mas aceitar apaticamente, nunca. E acho que não conseguiria isso em nenhuma hipótese. Talvez essa dificuldade tenha a ver com a visão que tenho de que as pessoas que machucam os outros, em qualquer circunstâncias, não devem ser digna de panos quentes. Assim, perdão, desculpa ou piedade são palavras criadas para amenizar e ajustar uma cultura agressiva. E nada resolve. O problema é quando se contagiamos por essa mesma estupidez e com ela começamos a responder. Perigoso. Acho que nessas horas é momento de se cogitar em mudar de postura. Ao longo da história brasilera, tivemos vários momentos de estupidez. Nesse momento, estamos acompanhando, via Comissão da Verdade, a situação do Estado frente a explicação sobre partes escuras de nossa história. Acho precioso a presidenta Dilma ter delclarado que o Estado não será vingativo e não se guiará pelo ódio. Mas não tenho dúvida, fazer os acusados e toda a sociedade enxergar transparentemente o que ocorreu naqueles anos de chumbo é muito salutar.


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Há exatos 50 anos, o cinema brasileiro ganhava a Palma de Ouro do Festival de Cannes com o longa-metragem O pagador de promessas, dirigido por Anselmo Duarte. O filme conquistou a simpatia do júri do festival, que preteriu obras como O anjo exterminador (Luis Buñuel), Electra, a vingadora (Michel Cacoyannis) e O eclipse (Michelangelo Antonioni), entre outros, que concorriam na seleção oficial. Apesar de ganhar o prêmio máximo do mais importante festival de cinema do mundo, Anselmo Duarte passou a vida reclamando do boicote dos cineastas do Cinema Novo, que nos anos seguintes levariam a bandeira do cinema brasileiro mundo afora. Em várias ocasiões, Duarte revelou que eles invejavam seu feito e atrapalharam sua carreira de diretor.

Veja uma resenha completa aqui.



terça-feira, 22 de maio de 2012

Alma Sebosa - por uma TV para a Democracia

Sobre o poder repressivo da moral e a cultura criminalizante a partir da Mída

Perturbou-me ontem uma situação ao sair do supermercado, quando minha companheira me avisou que uma pessoa havia sido pega furtando produtos de higiene, e que poderia estar sendo agredida pelos seguranças. Rapidamente fui me certificar se era um cara negro que havia se queixado perto de mim que um outro cara não parava de o cuidar, ele teria dito na ocasião a esposa “o magrão ali deve achar que estou cagado”. Possivelmente isso integrava a vigia sobre o outro indivíduo, na suposição de que haveria um grupo no local. De qualquer modo, este não estava envolvido. Mas fiquei intrigado, ao sair daquele comércio, sobre o que teria acontecido a pessoa detida. Acuado sobre o ato ilícito cometido, em geral o indivíduo que comete uma infração ou crime, se acha indigno de reclamar maus tratos e geralmente é nesse fato que se sustentam todas as indignidades e crueldades  de policiais e seguranças particularmente contra seres humanos nesse estado vulnerável. Direitos Humanos, nesse caso, é geralmente questão descartada. O crônico de nossa sociedade, todavia, é que a Mídia alimenta e cultiva o enfoque criminalizador, julgador e, se possível, punitivo das pessoas que agem fora da lei. Os repórteres e apresentadores, nesse caso, são os instrumentos básicos disso e se prestam sem escrúpulos a esse papel de juízes e, frequentemente, também carrascos. O vídeo abaixo, de centenas que já foram registrados na internet, ilustra essa clara agressão aos direitos humanos no País, onde os meios de comunicação usam uma suposta liberdade de imprensa para abusos inconcebíveis em um País sério, que se auto-afirme democrático.



Saiba mais outras opiniões sobre esse vídeo o Diário Gauche.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Horas que passam e fins de semana que ficaram

Imagem: http://mervy.in/index.php
O fim de semana foi caseiro, mas nem por improdutivo. Dei um giro pela Capital, nada de novo, mas deu para visitar uma conhecida de muitos anos, onde trocamos algumas idéias. Sábado é mesmo dia de relaxar, fazer coisa nenhuma. Já domingo, é uma divisão entre o útil e a expectativa do amanhã. Quer saber, eu cada vez quero ligar menos para categorizar os dias da semana, viver intensamente as horas é o que mais importa. Acho importante não ver TV mais do que o pontual. Intervalos, dispenso. Leio, durmo, faço um comida diferente, uma transitada na internet, e o tempo vai. Amigos casados não me anima muito em visitar, não sei porque. Talvez porque eles não me visitam. E não gosto também de vidas grudadas. Minha relação é com pessoas individuais não com pares, a menos que se assumam individualidades independentes, o que anda cada vez mais raro.  Acho parques interessantes, mas muito chatos às vezes. As pessoas são muito padronizadas neles, em geral. Tenho me convencido que a noite é mesmo mais interessante para se sair e viver. Creio que meu futuro breve deve envolver muito mais ela. Verei.

sábado, 19 de maio de 2012

sexta-feira, 18 de maio de 2012

FHC defende a regulação dos meios de comunicação

Foto: Carta Maior

Em um seminário promovido pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente defendeu a regulação da mídia como condição da democracia: "não há como regular adequadamente a democracia sem regular adequadamente os meios de comunicãção", afirmou FHC. “Os meios de comunicação no Brasil não trazem o outro lado. Isso não se dá por pressão de governo, mas por uma complexidade de nossa cultura institucional,” acrescentou.

O título, o ambiente e o programa sugeriam que o seminário “Meios de comunicação e democracia na América Latina”, realizado no último dia 15 no Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC), seria um palco para a cantilena contra a regulação do setor e de crítica feroz às iniciativas em curso em países da região. Não foi esse o tom predominante.

Com a participação de ex-presidentes da Bolívia e do Equador e um ex-porta voz da presidência do México, além do jornalista brasileiro Eugênio Bucci, o debate foi marcado principalmente por duas preocupações. De um lado, o desafio de manter um jornalismo investigativo independente em um cenário de enfraquecimento dos meios tradicionais. De outro, uma afirmação quase uníssona sobre a necessidade de regulação democrática do setor, resumida pelo ex-presidente brasileiro, presente ao evento: “não há como regular adequadamente a democracia sem regular adequadamente os meios de comunicação”.

Regulação em pauta
O seminário promoveu o lançamento de uma publicação conjunta do iFHC, Centro Edelstein de Pesquisas Sociais e da Plataforma Democrática chamada “Meios de comunicação e democracia: além do Estado e do Mercado”. A publicação é em boa parte pautada pela discussão sobre medidas de regulação dos meios de comunicação. O primeiro texto é de autoria dos argentinos Guillermo Mastrini e Martin Becerra, professores que estudam a concentração do setor na América Latina e que apoiaram a redação da lei de comunicação audiovisual aprovada no país em 2009.

No livro, o organizador da publicação, o sociólogo Bernardo Sorj, avalia que “generalizações sobre a América Latina mascaram realidades muito diferentes” e que “não é demais lembrar que qualquer legislação deverá orientar-se em primeiro lugar pelo objetivo de garantir a liberdade de expressão dos cidadãos frente ao poder do Estado e ao poder econômico”.

Na abertura do seminário, Sorj apresentou uma leitura dos contextos político e dos meios de comunicação e listou algumas das ações necessárias para alterar o quadro atual. No contexto político, o sociólogo identificou três elementos centrais: um sistema legal precário, uma crise de representação dos partidos e das ideologias políticas que valoriza o papel dos meios e a exigência de uma nova regulação dos meios em função da convergência tecnológica. Em relação ao contexto dos meios de comunicação, o sociólogo destacou a inexistência ou baixa audiência de emissoras públicas, sistemas regulatórios ultrapassados e nem sempre aplicados e uma tendência à concentração de propriedade.

As propostas apresentadas por ele reforçam a necessidade de regulação do setor privado e da ação do poder público e se assemelham em boa parte às apresentadas por setores que defendem a democratização da comunicação. Entre elas, o enfrentamento à concentração, o fortalecimento do sistema público e o apoio a pequenas e médias empresas de comunicação [ver lista completa ao final].

Crise de valores dos meios
As apresentações trouxeram abordagens complementares da relação entre meios de comunicação e democracia. Carlos Mesa, ex-presidente boliviano, salientou uma espiral de perda de valores que vivem os meios de comunicação e seus dirigentes. Ele comparou a crise da mídia com a crise do sistema financeiro, que descreveu como “uma orgia obscena do capitalismo”. Essa crise seria fruto de uma dificuldade de se situar em um cenário de organização da informação que tem a frivolidade como elemento central. “A mídia é protagonista e fiscalizadora, juiz e parte. Mas seu poder não vem acompanhado de responsabilidade”, observou.

Mesa repercutiu uma questão que atravessou todo o seminário, que é atual dificuldade financeira para sustentar o jornalismo investigativo. O problema, segundo ele, é que “apesar de vários meios impressos tradicionais terem uma grande audiência na internet, essa audiência não se transforma em recursos financeiros”. O desafio, portanto, seria garantir ao mesmo tempo credibilidade e capacidade de infraestrutura no novo cenário.

Conhecido por defender os interesses das elites bolivianas, Mesa não deixou de expor suas convicções. Ao discutir a necessidade de regulação da comunicação, o ex-presidente ressaltou que é preciso reconhecer que pode haver diferentes tipos de regulação e criticou a reserva de espectro realizada na Argentina, Uruguai e Bolívia. “Em meu país, um terço das frequências de rádio e TV está reservado para povos indígenas e originários e setores comunitários. O que eles farão com isso?”, perguntou ironicamente.

As observações do mexicano Rubén Aguilar, ex-porta voz de Vicente Fox (presidente entre 2000 e 2006), focaram-se mais na promiscuidade dos meios de comunicação e do Estado em seu país. Aguilar descreveu a relação entre as partes como sendo historicamente pautada pelas negociações financeiras, tendo mudado pouco nas últimas décadas. “Antes o governo pagava, agora os meios cobram”, observa Rubén.

Para ele, a marginalidade da imprensa escrita – o maior jornal da cidade do México tem tiragem de 100 mil exemplares – concentra muito poder no rádio e na televisão, o que se agrava pelo fato de que dois grupos econômicos controlam a maioria dos meios eletrônicos. “Vivemos uma situação hoje em que não há conflitos entre poder e meios de comunicação. Isso é muito ruim para a democracia”. Aguilar também defendeu abertamente a necessidade de regulação do setor.

A apresentação de Osvaldo Hurtado, ex-presidente do Equador, foi a única que se centrou no discurso recorrente que identifica ameaças à liberdade de imprensa nas ações de presidentes latino-americanos. Em sua mira, Rafael Correa, Evo Morales, Hugo Chávez e Daniel Ortega. Hurtado, que presidiu o Equador no início da década de 1980, focou-se especialmente nas críticas às ações de Correa, sugerindo inclusive que a sentença que ordenou ao jornal El Universo o pagamento de US$ 40 milhões de indenização a Correa teria sido redigida dentro do palácio presidencial do Equador.

Problemas brasileiros
Ao tratar do caso brasileiro, o jornalista Eugênio Bucci avaliou que a discussão no país está dificultada por duas irracionalidades: uma de matriz de direita, que diz que nenhuma regulação é necessária; outra, de matriz de esquerda, que defende a regulação por um desejo de censurar os meios. Para Bucci, a regulação é necessária, especialmente para enfrentar três gargalos: a confusão entre religião, meios e partidos; a presença possível de monopólios e oligopólios e o abuso das verbas dedicadas à publicidade oficial. Em sua opinião, os governos deveriam ser proibidos de anunciar, porque as verbas “dão espaço para proselitismo oficial com dinheiro público”.

No debate ao final das apresentações, o cientista político Sérgio Fausto lamentou que o Brasil não tenha a cultura do debate racional e prefira a confrontação de opiniões dogmáticas fechadas. Fausto avalia que essa seria a dificuldade de a internet substituir o papel dos meios tradicionais. “A democracia do acesso gera também a corrosão de valores fundamentais sem os quais poderemos ter mais vozes e menos democracia”, disse Fausto, que é também diretor executivo do instituto FHC.

A crítica mais contundente ao sistema de comunicações brasileiro veio do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em seus comentários, FHC criticou especialmente a ausência de pluralismo. “Os meios de comunicação no Brasil não trazem o outro lado. Isso não se dá por pressão de governo, mas por uma complexidade de nossa cultura institucional”, disse FHC. “Nós temos toda a arquitetura democrática, menos a alma”.

FHC afirmou ainda que é preciso lutar pelos mecanismos de regulação que permitam a diversidade. Para ele, “não há como regular adequadamente a democracia sem regular adequadamente os meios de comunicação”.

Sumário das propostas apresentadas na introdução do livro “Meios de comunicação e Democracia: além do Estado e do Mercado”, organizado por Bernardo Sorj, publicado pelo Instituto FHC, Centro Eldenstein e Plataforma Democrática:

Regulação da ação do poder público

1. A distribuição de concessões de rádio e televisão deve passar pela criação de uma agência reguladora que aja com transparência e cujas decisões sejam abertas ao debate e escrutínio público.

2. Garantir a autonomia dos canais ou emissoras públicas direta ou indiretamente dependentes de recurso público.

3. O uso e a distribuição da dotação pública para publicidade oficial devem ser transparentes e politicamente neutros.

4. O favorecimento de certos meios, quando realizado em nome do apoio a pequenas e médias empresas de comunicação, deve ser realizado com critérios transparentes e universais, abertos ao debate e ao escrutínio público.

5. A liberdade de informação inclui a obrigação dos governos de informar.

6. Garantir o acesso público aos conteúdos sem que eles sejam parasitados por sites comerciais e garantir a neutralidade da Rede.

Regulação do setor privado

1. Combater a concentração de propriedade dos meios privados, pela ação de agências reguladoras autônomas do poder governamental (não confundir a extrema concentração com a existência de grupos de mídia economicamente sólidos).

2. Garantir a sustentabilidade do jornalismo investigativo, pela sua importância para o sistema democrático.

3. Políticas públicas para favorecer o pluralismo, com política de apoio universal ao surgimento de novos jornais e subsídios que diminuam os custos de entrada no setor.

4. Conscientizar a sociedade sobre a importância de ter acesso à informação e ser capaz de realizar uma leitura crítica da informação recebida.

(*) João Brant é radialista e integrante do Intervozes

NOTA DA REDAÇÃO:

É da maior gravidade a simplificação feita por Bucci que, ao identificar uma "irracionalidade de matriz de esquerda" com desejos censores nos defensores da regulação, acaba por impor - intencionalmente ou não - a pecha de censores a todos os setores da esquerda que defendem a regulação democrática do setor. Carta Maior, uma publicação assumidamente de esquerda e defensora da regulação repele o carimbo arbitrário. Não só Carta Maior. A esquerda, as idéias progressistas, seus veículos de comunicação, e a própria ausência deles, tem sido, elas sim, objeto de censura política explícita ou de cerco econômico asfixiante por parte do dispositivo conservador que controla a comunicação na sociedade brasileira. Antes de afirmações graves como essa deve-se consultar a memória do país. Ela indica, por exemplo, que o debate do qual o senhor Bucci participa no Instituto FHC --e que Carta Maior cobre ecumenicamente, sem censura, mas com direito ao contraditório-- só acontece porque uma parte da esquerda empenhou-se em incorporar o tema à agenda política nacional. Com resistência superlativa ou dissimulada, diga-se, da parte de muitos que agora pontificam sobre o assunto. Bem-vindos; antes tarde que nunca. Não se pode, todavia, contrariar os fatos.

Frases de conveniência destinadas a sustentar uma equidistância baseada em generalizações desprovidas de conteúdo histórico podem facilitar o trânsito em salões e veículos que nem sempre primaram pela defesa da democracia, mas não contribuem para assegurar o primado da pluralidade à liberdade de expressão. O Brasil tem derrubados dogmas herdados do ciclo da ditadura política e de sua versão mercadista neoliberal. Rompeu-se o interdito da ação reparadora do Estado na esfera social; rompeu-se a esférica blindagem à ação do Estado na economia; rompe-se o cinturão de ferro em torno do capital financeiro e, mais recentemente, instalou-se uma Comissão da Verdade. Com todas as suas limitações, ela certamente não cometerá o despautério de orientar seu trabalho com base na descabida premissa de que a esquerda quer investigar a tortura apenas para assumir o lugar do torturador. O apoio bem-vindo, insista-se, do ex-presidente FHC à regulação da mídia reflete essa evolução da luta democrática no país, cujo avanço não pode excluir ninguém a priori, como se vê, mas dispensa preconceitos assentados em ressentimentos pessoais. (Direção Editorial de Carta Maior - Joaquim Palhares)

Solenidades e Reflexões

Não fui muito chegado a minha formatura de graduação, pois evito celebrações solenes, mas experimentei encarar uma solenidade breve da especialização que encarei  por 12 meses. Na real, foi mais um pretexto para rever os colegas do curso. Me surpeeendi-me comigo mesmo, em um estado de espírito bom, me senti legal na ocasião. Então, cada vez mais me convenço, que nada é 100% nessa vida, de tudo tiramos algo. Foram preciosos os momentos de diálogo, sobre coisas até banais às vezes, mas que são importantes para nos entender melhor as diferenças e singularidades que nos circundam. E entre esses papos, conheci uma defensora pública, com quem conversei sobre a situação dos travestis nas carceragens do País. Triste realidade. Na ocasião, ela me relatou que em uma cidade do interior do RS onde atua a situação é impactante para esse segmento, que tem que conviver em celas masculinas, sem nenhum critério de preservação sobre sua orientação sexual. Vi algo a nível de Estado sendo realizado nessa área, mas parece que ainda contempla pouco a quem precisa. Me fez lembrar o filme Madame Satã.


* Como não dependo mais de transporte coletivo diário, sempre me assusto quando tenho que sair nestes veículos na hora do pique. E fico pensando a vida que levam milhões de brasileiros, doando parte preciosa de sua vida ao stress. E disso não escapam os veículos particulares, que também não é meu caso.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Sobre essa estranha e rara mania humana de autenticidade


Foto: Jornal Agora - MS / Ag. Estado

As pessoas são estranhas, e compreender nem sempre está ao alcance de nossa capacidade. No entanto, precisamos sobreviver e conviver e, para isso, agimos, afirmamos e reformulamos comportamentos , recriando perfis correspondentes a expectativas. Em outras palavras criamos e recriamos personagens que aprendemos a acreditar que constituem o que somos. E um certo dia, se damos conta que não somos nada disso. E saímos a buscar um outro. Às vezes, dá tempo; noutras, a morte ou coisa que o valha nos surpreende. E isso mesmo pode ser o determinante de um novo nascimento.
* Se Comissão da Verdade, criada ontem pela presidente Dilma, contribuir para os jovens de hoje e amanhã enxergarem com outros olhos certas missões militares e seus heróis,  já terá cumprido com seu papel;
*Carolina Dickman influenciou na criação de uma nova legislação para punir os crackers pessoas físicas. Espero que esta se estenda também as pessoas jurídicas, que invadem suas caixas postais com spam, com informações coletadas não sei como nem de onde;
*Dia de Combate a Homofobia hoje, deveria envolver uma parada nacional em escolas, empresas e outras instituições onde a discriminação é muitas vezes criada e cultivada.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Para quem ainda não sabe, não existe almoço grátis - nem no Meio Ambiente

Abecedário Cosmonicante – Já / Momento supremo da vida / Definição vital / Futuro imediato

Imagem: http://blogs.jovempan.uol.com.br/
poeta/o-sonho-e-o-seculo-18/
Cláudia tinha mais de 40 e uma rotina diária, que a angustiava. De casa saía às 6h; trabalhava de Sol à Lua e mal tinha tempo para amar e sonhar. Um dia, em uma das mesmas travessas por onde acessava diariamente a barulhenta fábrica em que trabalhava, um carro lhe deu um fininho, e quase foi desta para melhor. Ou pior. Mas então, pensou, pior não podia. E decidiu mudar pra valer. Pediu demissão, vendeu tudo que tinha, despediu-se dos que encontrou naquela semana, e viajou, sem dizer para onde, nem quando voltava. Hoje, após 10 anos, dizem que anda vagando nos sonhos de muita gente. Por carta, sempre de locais diferentes, manda postais aos seus. E, perplexos, quando estes perguntam o que o moveu a isso, é singela, objetiva e enigmática. “Cansei de ser amanhã, e resolvi ser Já”.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Verdades, Ditaduras e Esculachos

Driblar a rotina é mais que uma necessidade de sobrevivência, é uma forma de inventar a felicidade a cada dia. Não tenho tido muito talento com isso, mas a gente se esforça. Entre verdades mentirosas e autênticas, criamos aos poucos a nossa verdade. E a Comissão da Verdade vem aí. Certamente é insuficiente para compensar quem sofrem os demandos da ditadura. Mas é um passo saber. O MST, como sempre na vanguarda, divulga o movimento Esculacho, que pela Argentina já se antecipa, criando constrangimentos públicos aos ex-ditadores. Quero só saber quando esse movimento vai se estender para o presente, também expondo ao público torturadores que permanecem nessa prática nas cadeias brasileiras.


segunda-feira, 14 de maio de 2012

Camila Moreno - Carta Maior
Há muito que esse papo de economia verde disfarça uma clara estratégia de grandes grupos empresariais no sentido de ajustar seus objetivos maiores a uma aura de "sustentabilidade", mas sem se desviar das matrizes predatórias que tem predominado na orientação da economia brasileira, nos seus vários segmentos. Ainda tenho expectativa de enxergar no País um projeto de grandes proporções e resultados, no sentido de explorar de forma mais ajustada às realidades e necessidades locais o enorme potencial presentes no País em elementos como o Sol, o Vento e até o próprio lixo que geramos.

Vale a pena, de qualquer modo, conferir a matéria da Carta Maior sobre esse tema.

Economia verde é novo discurso hegemônico, diz pesquisadora

Os defensores da economia verde têm no seu horizonte saber como o capitalismo vai viver para além dos combustíveis fósseis. A economia verde surge como alternativa para viabilizar não só a expansão da atual economia petroleira até seu limite, mas também o controle das novas fontes de energia pelas mesmíssimas empresas e grupos de poder que mandam no petróleo, avalia Camila Moreno, pesquisadora e coordenadora de sustentabilidade da Fundação Heinrich Böll.

sábado, 12 de maio de 2012

Mino Carta: Os chapa-branca da Casa Grande

Editorial

11.05.2012 09:53
 
Eternos chapa-branca


O jornal O Globo toma as dores da revista Veja e de seu patrão na edição de terça 8, e determina: “Roberto Civita não é Rupert Murdoch”. Em cena, o espírito corporativo. Manda a tradição do jornalismo pátrio, fiel do pensamento único diante de qualquer risco de mudança.

Desde 2002, todos empenhados em criar problemas para o governo do metalúrgico desabusado e, de dois anos para cá, para a burguesa que lá pelas tantas pegou em armas contra a ditadura, embora nunca as tenha usado. Os barões midiáticos detestam-se cordialmente uns aos outros, mas a ameaça comum, ou o simples temor de que se manifeste, os leva a se unir, automática e compactamente.

Não há necessidade de uma convocação explícita, o toque do alerta alcança com exclusividade os seus ouvidos interiores enquanto ninguém mais o escuta. E entra na liça o jornal da família Marinho para acusar quem acusa o parceiro de jornada, o qual, comovido, transforma o texto global na sua própria peça de defesa, desfraldada no site de Veja. A CPI do Cachoeira em potência encerra perigos em primeiro lugar para a Editora Abril. Nem por isso os demais da mídia nativa estão a salvo, o mal de um pode ser de todos.

O autor do editorial exibe a tranquilidade de Pitágoras na hora de resolver seu teorema, na certeza de ter demolido com sua pena (imortal?) os argumentos de CartaCapital. Arrisca-se, porém, igual a Rui Falcão, de quem se apressa a citar a frase sobre a CPI, vista como a oportunidade “de desmascarar o mensalão”. Com notável candura evoca o Caso Watergate para justificar o chefe da sucursal de Veja em Brasília nas suas notórias andanças com o chefão goiano.
Abalo-me a observar que a semanal abriliana em nada se parece com o Washington Post, bem como Roberto Civita com Katharine Graham, dona, à época de Watergate, do extraordinário diário da capital americana. Poupo os leitores e os meus pacientes botões de comparações entre a mídia dos Estados Unidos e a do Brasil, mas não deixo de acentuar a abissal diferença entre o diretor de Veja e Ben Bradlee, diretor do Washington Post, e entre Policarpo Jr. e Bob Woodward e Carl Bernstein, autores da série que obrigou Richard Nixon a se demitir antes de sofrer o inevitável impeachment. E ainda entre o Garganta Profunda, agente graduado do FBI, e um bicheiro mafioso.

Recomenda-se um mínimo de apego à verdade factual e ao espírito crítico, embora seja do conhecimento até do mundo mineral a clamorosa ignorância das redações nativas. Vale dizer, de todo modo, que, para não perder o vezo, o editorialista global esquece, entre outras façanhas de Veja, aquele épico momento em que a revista publica o dossiê fornecido por Daniel Dantas sobre as contas no exterior de alguns figurões da República, a começar pelo presidente Lula.

Concentro-me em outras miopias de O Globo. Sem citar CartaCapital, o jornal a inclui entre “os veículos de imprensa chapa-branca, que atuam como linha auxiliar dos setores radicais do PT”. Anotação marginal: os radicais do PT são hoje em dia tão comuns quanto os brontossauros. Talvez fossem anacrônicos nos seus tempos de plena exposição, hoje em dia mudaram de ideia ou sumiram de vez. Há tempo CartaCapital lamenta que o PT tenha assumido no poder as feições dos demais partidos.

Vamos, de todo modo, à vezeira acusação de que somos chapa-branca. Apenas e tão somente porque entendemos que os governos do presidente Lula e da presidenta Dilma são muito mais confiáveis do que seus antecessores? Chapa-branca é a mídia nativa e O Globo cumpre a tarefa com diligência vetusta e comovedora, destaque na opção pelos interesses dos herdeiros da casa-grande, empenhados em manter de pé a senzala até o derradeiro instante possível.

Não é por acaso que 64% dos brasileiros não dispõem de saneamento básico e que 50 mil morrem assassinados anualmente. Ou que os nossos índices de ensino e saúde públicos são dignos dos fundões da África, a par da magnífica colocação do País entre aqueles que pior distribuem a renda. Em compensação, a minoria privilegiada imita a vida dos emires árabes.

Chapa-branca a favor de quem, impávidos senhores da prepotência, da velhacaria, da arrogância, da incompetência, da hipocrisia? Arauto da ditadura, Roberto Marinho fermentou seu poder à sombra dela e fez das Organizações Globo um monstro que assola o Brazil-zil-zil. Seu jornal apoiou o golpe, o golpe dentro do golpe, a repressão feroz. Illo tempore, seu grande amigo chamava-se Armando Falcão.

Opositor ferrenho das Diretas Já, rejubilado pelo fracasso da Emenda Dante de Oliveira, seu grande amigo passou a atender pelo nome de Antonio Carlos Magalhães. O doutor Roberto em pessoa manipulou o célebre debate Lula versus Collor, para opor-se a este dois anos depois, cobrador, o presidente caçador de marajás, de pedágios exorbitantes, quando já não havia como segurá-lo depois das claras, circunstanciadas denúncias do motorista Eriberto, publicadas pela revista IstoÉ, dirigida então pelo acima assinado.

Pronta às loas mais desbragadas a Fernando Henrique presidente, com o aval de ACM, a Globo sustentou a reeleição comprada e a privataria tucana, e resistiu à própria falência do País no começo de 1999, após ter apoiado a candidatura de FHC na qualidade de defensor da estabilidade. Não lhe faltaram compensações. Endividada até o chapéu, teve o presente de 800 milhões de reais do BNDES do senhor Reichstul. Haja chapa-branca.

Impossível a comparação entre a chamada “grande imprensa” (eu a enxergo mínima) e o que chama de “linha auxiliar de setores radicais do PT”, conforme definem as primeiras linhas do editorial de O Globo. A questão, de verdade, é muito simples: há jornalismo e jornalismo. Ao contrário destes “grandes”, nós entendemos que a liberdade sozinha, sem o acompanhamento pontual da igualdade, é apenas a do mais forte, ou, se quiserem, do mais rico. É a liberdade do rei leão no coração da selva, seguido a conveniente distância por sua corte de ienas.

Acreditamos também que entregue à propaganda da linha auxiliar da casa-grande, o Brasil não chegaria a ser o País que ele mesmo e sua nação merecem. Nunca me canso de repetir Raymundo Faoro: “Eles querem um País de 20 milhões de habitantes e uma democracia sem povo”. No mais, sobra a evidência: Roberto Civita é o Murdoch que este país pode se permitir, além de inventor da lâmpada Skuromatic a convocar as trevas ao meio-dia. Temos de convir que, na mídia brasileira, abundam os usuários deste milagroso objeto.