terça-feira, 30 de novembro de 2010

Violência nos morros do Rio

Por Hélio Bicudo (blog do autor).
Analisar o que está acontecendo no Rio de Janeiro não me parece uma tarefa fácil. Ao contrário, ficamos quase perplexos com o momento. As UPPs a enfrentar a resistência de grupos presumivelmente de traficantes que vêem seu comércio desfazer-se diante do afastamento popular das atividades criminosas, que pretendem manter as comunidades sujeitas ao seu comando.

Não se trata, ao que parece, apenas do tráfico, mas da venda de proteção, comércio de armas e munições, e, sem dúvida também, da prostituição.

É evidente que semelhante situação é ou era alimentada pelas milícias, com policiais e delinqüentes impondo-se ao comando dos achaques para ligar-se a determinados grupos, eliminando outros, enfim, participando em larga escala da corrupção como alimento da violência.

Quem quiser ter uma noção do que ocorre hoje na antiga capital da República, que vá assistir “Tropa de Elite 2”, que dá uma noção realista da verdadeira guerra que ali se trava, onde não se sabe quem é do bem ou quem é do mal.

Aliás, as organizações criminosas que foram instituídas a partir do “Esquadrão da Morte” do final dos anos sessenta, em São Paulo, mantêm a mesma promiscuidade entre delinqüentes e policiais e são o fruto da corrupção que não é apenas do estamento policial, mas de parcelas importantes da sociedade, no viés de obter ganhos a qualquer preço, para alimentar o consumismo que políticas públicas incentivam.

Basta olhar para as nossas instituições, para ver a que ponto chegamos.  Desde a Constituinte dos anos 86 a 88, podemos observar que os poderes da República entraram num plano inclinado, onde os partidos políticos afastam tantos quantos podem atrapalhar sua ânsia de poder para enriquecer, determinando em conseqüência o baixo nível que hoje predomina no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Tantos quantos procuram cargos nos dois primeiros, salvo naturalmente poucas exceções, não o fazem para prestar um serviço, mas para engordar os seus bolsos, atitude que encontra estímulo num Poder Judiciário subordinado e amedrontado.

É esse estado de coisas – cada um segundo seus interesses – que leva à deterioração hoje patente não só no Rio de Janeiro, como em outras grandes cidades do País, como São Paulo e etc.

Na verdade, a sociedade civil, que não está por dentro do que acontece, não sabe que direção adotar. O uso da violência para acabar com a violência não tem sido o bálsamo desejável. Atitudes equivocadas no equacionamento do problema não conseguiram encontrar o caminho hábil para o estabelecimento de políticas que possam resolver o sofrimento de meninos e meninas abandonadas, de famílias que lutam para sobreviver, enfim a situação de carência em que os brasileiros mais pobres vegetam.

Como se verifica, o assistencialismo não é a solução. As pessoas querem ser tratadas com dignidade e não como sujeito de deveres. Querem participar o que, aliás, é vedado, mesmo porque o segredo é a alma do negócio.

Ninguém sabe – e ninguém se interessa pelo que acontece na periferia das grandes cidades. A violência é expandida. E enquanto predominam o desinteresse de um lado e de outro a violência, o caos vai se implantando até o momento em que se torna incontrolável. Então, a solução é matar.

Hoje há uma certa euforia com o resultado obtido com a ocupação do Complexo do Alemão pelas forças militares e policiais.

Contudo, ninguém sabe de nada. A Folha de São Paulo de domingo passado publica o retrato de dois negociadores da ONG Afroreggae e faz referência à atuação deles. O resultado está aí: a ocupação se fez pacificamente, mas não se sabe em que condições. Ora, é preciso que se saiba de quem partiu a solicitação de negociação. A promessa da guerra cedeu passo à realidade: como explicar o massacre de mais de quinhentas pessoas à comunidade internacional? 

Em remate, é preciso que a OAB, o MP, o Judiciário, enfim todos nós sejamos informados do que realmente acontece – quais os personagens e seus objetivos – para que possamos, todos juntos, encontrar os caminhos para o estabelecimento da paz, que não deve ser apenas mais uma situação provisória. Que vá alem da intervenção feita, abrangendo o estabelecimento de agentes públicos das áreas da educação, saúde e lazer. Enfim, algo definitivo.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O jornalismo desonesto e o mito do “crime organizado”

Vale a pena conferir, no coletiva.net, o artigo de Gustavo Barreto, O jornalismo desonesto e o mito do “crime organizado. Uma análise da complexidade de relações políticas que envolve a crise do Rio.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Esse Rio tão estranho e caricaturizado

O Rio está o caos. Esse é o lugar comum, que todos falam. E dizer diferente soa estranho, pois é isso que se sabe, que se mostra. Por que o RJ, na realidade, é estranho ao resto do Brasil. Assim, como todos os recantos do Brasil, o Rio também integra essa construção maniqueísta sobre uma realidade. Que o tráfico do RJ é sistêmico e existe há muito, não é novidade. Mas é só isso que existe na favela? A novela das 9, sempre quando se atreve a retratar aquela realidade, cai na caricaturização ou na maquiagem, distante, imbecil. E, no outro extremo, a "Cidade Maravilhosa". Como seria interessante conhecermos o Rio real, para além de estigmas e extremos. Enquanto não temos isso - salvo raras exceções, como "Cidde dos Homens" - apreentadores, locutores e colunistas sensasionalistas vão se salivando e reproduzindo esses retratos estigmatizantes, João Moreira Salles procurou um retrato vivo de todos os lados e fatores dessa violência. O documentário é de 1999, mas vale a pena conferir. Aqui.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Sobre essa totalidade entre o eu e o os outros

Nós, que sentimos pulsar o que o mundo sente, somos uma fome diária, sempre entre o Planeta e o Coração. Às vezes todo dentro, às vezes todo  fora. Absolutamente incertos. Daí a gritante necessidade de afirmar e reafirmar diariamente a nossa limitação de interpretar a vida. Todos, pessoas - institucionalizadas ou não deveriam assumir essa impossibilidade de compreender completamente o estranho, de dizer pelo outro. É o passo modesto, contido, mas insdispensável para começar a nos entender. E, quem sabe assim, revelar melhor o que somos e construir com mais profundidade o que queremos.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Nada de novo na disneilândia midiática

Saio de um debate ao vivo sobre os interesses e obstáculos para a regulamentação de um marco regulatório no setor da comunicação no Brasil e, quando chego em casa, para minha surpresa, encontro uma síntese desse bloqueio: o deputado federal Roberto Freire, um assumido serrista na última campanha presidencial, interlocutor do discurso demotucano pela liberdade irrestrita dos donos do meio de comunicação no Roda Viva - programa de uma TV (que deveria ter um caráter) Pública, antes de se tornar canal hegemonizado pelo PSDB, participando de um programa de debates com a presença exclusiva de jornalisas afinados com o pensamento dos grandes grupos da mídia brasileira (Folha, Época e Globo e Veja). Nada mais redundante, nada mais entediante.

sábado, 20 de novembro de 2010

Mídia, golpes e tortura



No Brasil a Casa Grande não descansa. E a principal voz da Casa Grande no Brasil é a mídia hegemônica, aquele grupo de poucas famílias que se pretende o intérprete da realidade brasileira, apesar de há muito ter deixado de sê-lo. A um jornalismo sério, que tivesse compromisso com a história, a um jornalismo que tivesse alguma ligação, tênue que fosse, com a idéia de democracia, que se preocupasse com a educação das novas gerações, caberia discutir a monstruosidade da tortura, mostrar o que ela tem de lesa-humanidade. Mostrar que qualquer processo que envolva tortura não merece qualquer crédito. Mas esse não é o jornalismo brasileiro. O artigo é de Emiliano José.

E falando em teatro ...

... e da redução da expressão do pensamento e da expressão crítica, em suas difenretes formas...

Mais uma restrição de liberdade artística se soma à detenção da performista Telma Scherer, em plena Feira do Livro.

Está circulando agora na internet esse chamado:

Votação na Câmara Municipal de Porto Alegre
da Moção de Solidariedade à Cambada de Teatro em Ação Direta Levanta FavelA...



"Esta moção de solidariedade aos artistas de rua do Grupo de Teatro Levanta Favela que realizam um imenso esforço para exercer as suas atividades onde o povo está, ou seja, nas vias públicas de Porto Alegre e que sofreram repressão policial enquanto realizavam uma apresentação teatral na chamada “Esquina Democrática” no Centro de Porto Alegre, deve existir um questionamento da sociedade ao Comando Geral da Brigada Militar para esse tipo de problema.  Certamente esse tipo de atividade colabora para que o acesso à cultura seja ampliado em nossa cidade, portanto os artistas merecem APOIO DO PODER PÚBLICO E NÃO REPRESSÃO."         
DIA 22 DE NOVEMBRO, SEGUNDA FEIRA!
A partir das 14h na Câmara Municipal de Porto Alegre
(
Av. Loureiro da Silva, 255 perto do Chocolatão)

CONTAMOS COM A PRESENÇA DE TODOS,
 PORQUE A LUTA É COMO UM CÍRCULO, PODE COMEÇAR EM QUALQUER PONTO, MAS NÃO TERMINA NUNCA!!!!!!


Cambada de Teatro em Ação Direta Levanta FavelA...
levantafavela@hotmail.com
http://levantafavela.blogspot.com

A abordagem policial reclamada pode ser conferida. aqui.

* Áreas públicas restritas à liberdade de expressão
* Detenções por manifestações culturais em um evento cultural
* Exibição e uso de força desnecessária em público

A liberdade de expressão, assegurada pela democracia representativa estaria sendo comprometida no RS?
A subjetividade do medo, difundida na imprensa grande, está se voltando agora ao próprio público principal dessa imprensa - classe A e B?
E os setores mais alienadamente ricos da sociedade, por sua vez, até que ponto são vítimas e até que ponto são cúmplices desse clima, consumindo, alimentando e atiçando essa mesma subjetividade do medo contra os pobres?
O foco da difusão do medo e da concentração da violência estaria transbordando da periferia, dos atos públicos dos movimentos sociais e dos presídios?
A criminalização dos movimentos sociais e dos excluídos estaria também se estentendo à cultura de rua?

Tudo isso pode ser apenas elementos de uma teoria de conspiração minha, aliada à inexperiências de alguns soldados e coincidências de fatos.
Mesmo assim,
uma frase curiosa, em meio ao tumulto da detenção da artista Telma Scherer, chama a atenção:

"A ordem partiu de quem?"

Importante observar, necessário pensar.




Teatro Mágico e Hip hop contra o vazio da TV

Bela combinação de teatro e música contra a mediocridade de uma conhecida máquina. Dica da jornalista Letícia de Jesus.


sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Será que a Justiça assume essa necessidade popular?

Do site do PSOL, veiculado na Carta Capital

PSOL quer regulamentar artigos da Constituição sobre comunicação
Petição inicial da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, ajuizada pelo jurista Fábio Konder Comparato (foto), requer ao STF que determine ao Congresso Nacional a regulamentação de matérias existentes em três artigos da Constituição Federal (220, 221 e 223), relativos à comunicação social. Entre as providências, está a criação de uma legislação específica sobre o direito de resposta, a proibição de monopólio ou oligopólio dos meios de comunicação social e a produção e programação exibida pelos veículos.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O esgoto dos da imprensa grande e seus representantes "comentaristas"

A imprensa grande, sem freios de regulamentação alguma pela sociedade civil, se dá ao luxo de veicular todo lixo, sob a forma de opinião. Daí, fica comum se dispor aos telespectores essas opiniões monstruosas e discriminatórias, como a do comentarista Luiz Carlos Prastes, culpando os menos instruídos, que passaram a ter carro, pelo problema no trânsito. Quem achar que vale a pena ver isso, confira aqui.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Mott sobre ataques a gays: Igrejas têm mãos sujas de sangue

Ana Cláudia Barros, do Terra Magazine

O espancamento de homossexuais por jovens de classe média alta na Avenida Paulista e a tentativa de homicídio contra um rapaz de 19 anos após a Parada Gay na orla de Copacabana, no Rio de Janeiro, ambos ocorridos no último fim de semana, são, na opinião do antropólogo e historiador Luiz Mott, resultado da intolerância, reforçada por um discurso fundamentalista religioso.
"A maior visibilidade e a conquista de espaços públicos por parte de homossexuais provocam a ira dos mais intolerantes, que estavam acostumados a um complô do silêncio", afirma, completando:
- As igrejas cristãs, em geral, têm as mãos sujas de sangue, pela intolerância que divulgam nos púlpitos e nas televisões. Elas fornecem munição ideológica para aqueles que têm ódio de homossexuais, fazendo com que esse ódio aumente. Vai chegar uma época em que o papa e essas igrejas vão pedir desculpas de joelhos aos homossexuais, como a igreja já pediu desculpas aos judeus, negros e índios.
Para Mott, que é fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), o País trata a questão da homossexualidade de forma contraditória:
- O Brasil tem um lado cor de rosa, que é representado pelas paradas gays, tem mais de 200 paradas e a maior parada gay do mundo; tem a maior associação LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais) da América Latina; tem o Programa Brasil Sem Homofobia, ou seja, conquistou muitos avanços, mas tem um lado vermelho sangue. O Brasil é o país líder em assassinatos de homossexuais. Não é o país mais homofóbico do mundo, porque não temos leis, como no Egito ou no Iraque, onde os homossexuais podem ser executados, mas, a cada dois dias, um gay, uma travesti ou, em número muito menor, uma lésbica é vítima de crimes de ódio. São crimes praticados com requintes de crueldade.
Confira a entrevista.

Terra Magazine - No último fim de semana, houve episódios de violência contra homossexuais, tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo...
Luiz Mott -
E acrescente três travestis assassinadas no Paraná, também no último fim de semana. A bruxa está solta. A maior visibilidade e a conquista de espaços públicos por parte de homossexuais provocam a ira dos mais intolerantes, que estavam acostumados a um complô do silêncio. Os próprios homossexuais não se expunham para evitar situações de risco. Há anos, na Bahia, quando passavam um gay e os machistas percebiam, eles gritavam: 'Tchibum'. Como dizendo: 'Ali passa o veado, vamos caçar o veado'. Era uma forma de desmascarar.
Hoje, as pessoas partem para a agressão física, como aconteceu (em 2000) com o Edson Neri, na Praça da República (São Paulo), que foi o caso mais emblemático. Ele foi trucidado por um bando de carecas neonazistas. Acho que essa visibilidade incomoda. Há também a intolerância religiosa, que continua pregando como nunca, a ponto do (pastor Silas) Malafaia colocar cartazes na rua, dizendo que Deus criou o homem e a mulher, ou seja, a homossexualidade é uma aberração, um pecado.Tem essas duas coisas, a visibilidade que provoca a intolerância, que é reforçada por um discurso fundamentalista.
O Brasil tem um lado cor de rosa, que é representado pelas paradas gays, tem mais de 200 paradas e a maior parada gay do mundo; tem a maior associação LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais) da América Latina; tem o Programa Brasil Sem Homofobia, ou seja, conquistou muitos avanços, mas tem um lado vermelho sangue. O Brasil é o país líder em assassinatos de homossexuais. Não é o país mais homofóbico do mundo, porque não temos leis, como no Egito ou no Iraque, onde os homossexuais podem ser executados, mas, a cada dois dias, um gay, uma travesti ou, em número muito menor, uma lésbica é vítima de crimes de ódio. São crimes praticados com requintes de crueldade.

A principal justificativa desses assassinatos é o preconceito, a aversão aos homossexuais?
Sim. São crimes em que a vulnerabilidade da vítima é fator fundamental. O assassino parte do pressuposto ou que o gay é frágil, efeminado, não vai reagir, é presa fácil ou que ele não vai ter o apoio dos vizinhos, do zelador do prédio, porque os gays são pessoas, muitas vezes, odiadas. Há casos em que o gay gritou pedindo socorro e a vizinha não foi porque teve medo ou porque não tinha nenhuma solidariedade.
Há ainda outro fator, que chamamos de homofobia cultural. Por que a travesti está fazendo pista (se prostituindo) e, muitas vezes, está envolvida no crack? Porque ela foi jogada, foi expulsa para a margem da sociedade. Então, mesmo nos crimes em que há envolvimento com droga ou nos casos de latrocínio praticado por rapazes de programa, que transam com o gay e depois matam e roubam a vítima, a homofobia cultural está presente. Partiu-se do princípio de que veado tem mais é que morrer.

Você apontou os paradoxos que há no Brasil (o cor de rosa e o vermelho sangue). Há uma falsa tolerância?
Na verdade, há essa contradição. Os estrangeiros costumam dizer que, na América Latina, não há lugar mais fácil para paquerar, transar com homens gays, bissexuais do que no Brasil. Ao mesmo tempo, é um País que tem esse componente de agressividade letal. Em 2009, foram 198 assassinatos documentados. Em 2010, até ontem, eram 175 assassinatos. A tendência é que feche o ano ou no mesmo número ou em número maior. A média (sobre vítimas) geralmente é de 70% de gays, 27% de travestis e 3% de lésbicas.

Como essa contradição pode ser explicada?
Considero que o machismo brasileiro e o latino-americano tem raiz histórica no escravismo. Os brancos machos, donos do poder, eram menos de 20% da população. Então, para manter os outros 80% da população submissos, explorados, o macho latino-americano tinha que ser super violento e viril. Qualquer efeminação, medo podiam representar uma possibilidade de os oprimidos tomarem conta. Então, acho que essa violência contra homossexual é uma forma de afirmação da masculinidade. A homofobia e os crimes de morte têm a ver com uma afirmação do machismo, da virilidade e com a ideia de, sobretudo quando o gay é assassinado por rapaz de programa, uma questão de classe.
Há pesquisas que mostram que as pessoas de classes sociais mais baixas são mais homofóbicas, mais intolerantes, mais conservadoras.

Mas o ataque, por exemplo, aos jovens gays na Avenida Paulista foi promovido por estudantes de classe média alta.
Primeiro, tem que ver se é mesmo classe média alta ou simplesmente de classe média. A homofobia está presente em todas as classes sociais, inclusive na classe alta, embora seja predominante nos extratos mais baixos.

A universidade Mackenzie publicou em seu site um manifesto contra a lei que crimiminaliza a homofobia. O que você achou da iniciativa?
Desde o tempo em que eu era estudante da Faculdade Maria Antônia (USP), em frente ao Mackenzie, havia guerras campais. A Maria Antônia era reduto dos comunistas. Eles (Mackenzie) sempre foram reacionários, extremamente conservadores. Eu me admiro porque a intolerância tem sido maior nas igrejas penteconstais, que não são as igrejas protestantes históricas. E eles são presbiterianos, que é uma igreja histórica que, nos Estados Unidos, tem um posicionamento muito mais favorável. Há pastores gays assumidos no presbiterianismo, inclusive no Brasil. Foi muito chocante uma igreja mais aberta, como a presbiteriana, e pelo fato de ser em uma universidade, um lugar onde se deve ensinar a ciência, e não o criacionismo. É uma inversão. A universidade virou um púlpito, mais intolerante do que as próprias igrejas pentecostais, Universal, Assembleia de Deus, que têm como líderes Malafaia, (Marcelo) Crivella e Magno Malta, que são nossos maiores inimigos.

Para você, um posicionamento mais radical em relação à homossexualidade colabora para a ocorrência de crimes contra homossexuais?
Com certeza. As igrejas cristãs, em geral, têm as mãos sujas de sangue, pela intolerância que divulgam nos púlpitos e nas televisões. Elas fornecem munição ideológica para aqueles que têm ódio de homossexuais, fazendo com que esse ódio aumente. Vai chegar uma época em que o papa e essas igrejas vão pedir desculpas de joelhos aos homossexuais, como a igreja já pediu desculpas aos judeus, negros e índios.
Particularmente, esse papa Bento XVI se distinguiu, desde quando era assessor de João Paulo II, como sendo o mais intolerante dos papas dos últimos séculos. Ele disse: 'O homossexualismo (usando o termo patológico) é intrinsecamente mau'. Então, a partir daí é que as igrejas protestantes, inclusive muçulmanos, impediram que na Organização das Nações Unidas seja incluída a orientação sexual como direito humano fundamental.

Há muita resistência para aprovação do PLC (Projeto de Lei da Câmara) 122. Você acredita que a lei que criminaliza a homofobia vai ser aprovada? Qual sua expectativa?
Faltou vontade política ao Lula. Ele poderia ter pressionado a bancada aliada para que votasse. Há mais de uma dezena de leis no Congresso Nacional dentro da agenda LGBT e nenhuma foi aprovada. Como a Dilma vai ter maioria nas duas Casas, vamos pressionar ao máximo para que ela mobilize seus aliados.
A senadora eleita Marta Suplicy disse textualmente que a situação dos homossexuais no Brasil piorou. O número de assassinatos aumentou, nenhuma lei foi aprovada e nossos vizinhos conquistaram mais direitos, como a Argentina, que tem o casamento gay. Até o Chile e o Uruguai tiveram legislações contra a homofobia aprovadas, de modo que, infelizmente, na última década, eu digo: Se ficar, a Aids pega, se correr o homófobo mata. Para os homens heterossexuais, a Aids representa 0,8% de infecção. Entre os gays é de 11%. Infelizmente, a esperança de vida para os homossexuais nos últimos anos piorou, diminuiu. É preciso políticas efetivas. Não há nenhum governo que tenha feito tanta mobilização, programas, conferências, coordernadorias, mas nada sai do papel.

Você acha que se o PLC 122 fosse aprovado inibiria de fato a violência contra homossexuais ou seria uma lei inócua?
Há mais de 20 anos que o Grupo Gay da Bahia pleiteia a equiparação da homofobia ao racismo. Bastava para nós que os mesmos insultos, agressões, discriminações que são categorizados, no caso do racismo, como crime inafiançável, que fossem na mesma extensão para os delitos em relação à orientação sexual. Porém, esse projeto de lei, da Iara Bernardi (PT), que é a autora original do projeto, foi muito detalhado. Inclusive, como aconteceu com a lei de Juiz de Fora (Lei Municipal nº 9791, conhecida por 'Lei rosa'), permitindo afeto em público por homossexuais...
Não tinha necessidade de colocar isso no PLC 122, porque o que não é proibido é permitido. É isso que tem atraído a ira dos evangélicos. Eles acham que os gays vão se beijar e transar dentro da igreja. Acho que o projeto de lei é importante porque tipifica os delitos de homofobia e, sendo aprovado, vai inibir a prática da homofobia no dia-a-dia, mas não tem nada sobre a violência letal. Falta no projeto uma explicitação sobre isso.
A aprovação é fundamental, sobretudo, para marcar a presença de 10% da população brasileira constituída por LGBTs, que vão ter o mínimo de proteção legal. Na Constituição de 1988, não incluiu a proibição de discriminar por orientação sexual e isso permite que juizes, delegados, policiais digam que discriminar gay não é crime. Em outros países há leis severas contra a homofobia.

A utopia, para além do trabalho

A idéia de trabalho como fonte de saúde e estratégia de organização coletiva, para muito além da subsistência humana, me parece uma noção atraente. Sou mesmo dos que pensam que o sentido de trabalhar deve se encontrar com o prazer de fazer o que se gosta, para realmente ser construtivo. E nesse meio, ele é uma rica fonte de prevenção à doenças. E, na medida em que permite a interação social em torno de um objetivo comum, é também uma das melhores estratégias de articulação política, acima das diferenças. Mas o trabalho também pode ser o caminho de um sonho. E nesse caso, ele nunca se consome em si. É uma continuidade. Me vem a cabeça, como síntese disso, o filme argentino Un lugar en el mundo. Uma pitada dessa obra, para quem ainda não assistiu, pode ser conferida aqui.


terça-feira, 16 de novembro de 2010

Discussões mais que pertinentes

Religião e política não se discute, dizem alguns. O pressuposto é que ambas áreas levam os descontentes em um debate ao lado pessoal, trazendo rancores indesejáveis. Nossa cultura brasileira, de "homem cordial", geralmente ignora ou descarta conscientemente o embate crítico entre íntimos em um nível de amadurecimento da própria relação. Uma pena. Religião e política, creio, são tão dignas de discussão analítica, quanto filosófica. E vou mais longe, cada um desses campos tem muito do outro. Por vezes, se confundiram e se confundem profundamente. E se fossem mais e melhor discutidos, talvez tivéssemos uma política mais avançada e religiosos mais presentes em seu tempo.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

ENEM sofre ofensiva de interesses ligados à indústria do vestibular

Na avaliação do sociólogo e consultor na área de educação, Rudá Ricci (foto), há uma disputa de política educacional em curso, e é necessário preservar uma avaliação de caráter nacional. "Uma prova nacional permite que o país trace objetivos de política educacional", defende. Entre os setores interessados economicamente, segundo ele, estão as próprias universidades, que arrecadam em matrículas, os professores que produzem questões fechadas e abertas, e os cursos preparatórios para o vetibular.
Publicado originalmente na Rede Brasil Atual - Veiculado em Carta Maior
São Paulo – O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) sofre uma ofensiva de interesses, segundo o sociólogo e consultor na área de educação Rudá Ricci. Ele enumera grupos e setores do que chama de "indústria do vestibular", de cursos preparatórios a docentes encarregados de formular as provas. Para ele, há uma disputa de política educacional em curso, e é necessário preservar uma avaliação de caráter nacional.

"Uma prova nacional permite que o país trace objetivos de política educacional", esclarece. Um vestibular nacional do ponto de vista da aplicação e do conteúdo promove um impacto no ensino médio, de modo a reverter problemas dessa faixa da educação.

Para ele, os vestibulares descentralizados, feitos por cada universidade, provocam danos à educação, já que o ensino médio e mesmo o fundamental direcionam-se às provas, e não à formação em sentido mais amplo. "O ensino médio é o maior problema da educação no Brasil, é o primeiro da lista, com mais evasão, em uma profunda falência", sustenta.

"O Enem faz questões interdiciplinares, é absolutamente técnico, é super sofisticado", elogia. Os méritos estariam em privilegiar o raciocínio à memorização de conteúdos. Isso permitiria que o ensino aplicado nas escolas fosse além do preparo para enfrentar provas de uma ou outra universidade.

O Enem traz uma "profunda revolução", na visão de Rudá, "ao combater profundamente a concepção pedagógica e política de vestibulares por universidade". Ao se aproximar dessa concepção nacional – fato que aconteceu apenas nos últimos anos –, interesses de grupos educacionais foram colocados em xeque, o que desperta ações contrárias.

Entre os setores interessados economicamente, segundo ele, estão as próprias universidades, que arrecadam em matrículas, os professores que produzem questões fechadas e abertas, e os cursos preparatórios para o vetibular.

Controle social
Ricci critica a postura do ex-ministro da Educação, Paulo Renato, e da ex-secretária de Educação de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro. O sociólogo taxa os comentários feitos pelos especialistas ligados ao PSDB como "oportunismo". Isso porque, segundo ele, o uso da prova como seleção e seu caráter nacional, hoje criticados pelos tucanos, foram objetivos perseguidos durante a gestão de Renato na pasta, de 1995 a 2002.

O que ele considera como mudança de postura é resultado da disputa política, que faz com que os estudantes passem a rejeitar o exame. "Os jovens não querem mais essa bagunça. E têm razão", pontua.

"Existe uma movimentação para politizar esse tema; vamos ter o avanço de uma oposição organizada, que junta as forças políticas que perderam a eleição nacional com escolas particulares, cursinhos que têm muito interesse na manutenção do sistema de vestibular", avalia.

O sociólogo defende o modelo de exame nacional, mas acredita que a fórmula possa ser aprimorada, seja com mais dias de provas, seja com provas aplicadas a cada ano do ensino médio. Ele aponta ainda que houve um desvirtuamento da proposta interdisciplinar e sofisticada, empregada originalmente, em função da necessidade de expandir a prova. Em 2010, foram 4,6 milhões de inscritos.

Ele acredita que a postura de críticas deve-se às diferenças partidárias. "Estão politizando o Enem, politizando o ingresso na universidade e o conteúdo da prova", lamenta. "Seria interessante ter um órgão que execute o exame sob controle social, não de governo, nem de empresas", sugere.

"A solução é nós discurtirmos nacionalmente esse gerenciamento em um modelo como o americano para o vestibular nacional", defende. O SAT, usado como método de seleção nos Estados Unidos, é aplicado por agentes privados de modo controlado pelo departamento de educação federal. Além de poder ser aplicado em dias diferentes, cartas de recomendação de professores e outros instrumentos também são considerados na seleção por parte de universidades.

São Paulo, o PSDB e os Outros

Muito oportuno a esse debate sobre os desencontros entre paulistanos e nordestinos é o artigo A resistência à mobilidade social, de Maria Inês Nassif. (espero que esta não termine por ser outra colunista vitimada com a pena de demissão por expressar uma posição dissoante do discurso hegemônico da imprensa grande).

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Tiririca e a real alfabetização necessária

Para além do debate sobre a alfabetização do palhaço Tiririca, que apenas vai atestar sua capacidade de ler-escrever, a competência para o exercício de um mandato parlamentar como deputado federal deveria ser realmente avaliada por outros níveis. A história de vida, por exemplo.  Saber ler e escrever pode representar nada, se funcionalmente se prossegue analfabeto. Interpretar e relacionar os discursos é que são os domínios essenciais na política. E isso depende de várias habilidades humanas, onde a escrita e a leitura apenas são parte. Por outro lado, o nível de instrução também é um limitante grotesco para classificar a qualidade de um político.

Há inúmeros "analfabetos políticos" entrando, permanecendo e saindo das universidades e dos parlamentos brasileiros. E sobram também exemplos de corruptos que colecionam títulos acadêmicos. Assim como há hábeis e íntegros políticos atuando exemplarmente com a mínima instrução. E dependendo da origem de classe ou região de um homem público, a sua inaceitabilidade vai se dar, independente de capacidades ou qualidades. O presidente Lula, até hoje execrado por setores sociais que nunca vão admitir que um cidadão de baixo nível socio-economico assuma uma posição importante na esfera pública, é um exemplo notório disso.

É fato que eu, como milhares de brasileiros, paulistas ou não, consideraram vulgar e de mau gosto o tipo de discurso de Tiririca em sua campanha na Mídia, quando generalizava a má-conduta existente na Câmara dos Deputados. Incoveniente e irresponsável. Um desperdício. Mas isso é um outro enfoque de discussão, cuja abordagem contemplaria muitas candidaturas, incluindo palhaços profissionais ou eventuais.

Todavia, se Tiririca passar de fato nesse teste de capacidade, ótimo. O que pretendo acompanhar atentamente, juntamente com seus milhares de eleitores, é sua real postura para responder às demandas e expectativas da população que ele venha a representar. E que isso contribua para que São Paulo e o Brasil descubram cada vez mais as suas contradições.

Comida de Rua - Luiz Carlos Azenha

Reportagem série da Record que retrata o cotidiano de quem alimenta diariamente uma parte expressiva do Brasil no ritmo frenético das ruas. Uma abordagem diferenciada do tom estigmatizante e preconceituoso que predomina em reportagens sobre esse assunto. Mais um belíssimo trabalho de Luiz Carlos Azenha, jornalista que está dando um diferencial qualitativo valioso ao jornalismo daquela emissora.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Marco regulatório vs. liberdade da imprensa



Regular a mídia é ampliar a liberdade de expressão, a liberdade da imprensa, a pluralidade e a diversidade. Regular a mídia é garantir mais – e não menos – democracia. É caminhar no sentido do pleno reconhecimento do direito à comunicação como um direito fundamental da cidadania.
Em entrevista concedida ao Jornal da Band, no último dia 2/11, a presidente eleita Dilma Rousseff tentou esclarecer, pela undécima vez, uma diferença que a grande mídia e seus aliados têm ignorado e, arriscaria a dizer, deliberadamente confundido: marco regulatório da mídia não tem nada a ver com qualquer restrição à liberdade da imprensa.

Diante da inescapável pauta sobre as "ameaças à democracia e à liberdade de expressão e de imprensa" que o país estaria enfrentando, o apresentador, Fábio Pannunzio, pergunta:
Apresentador – Esse é um assunto que, apesar de a senhora ter falado mil vezes disso, ainda não ficou claro o suficiente para que as pessoas possam entender. Então, vou insistir na pergunta. A senhora disse no seu discurso de anteontem [31/10] que prefere o barulho de uma imprensa livre ao silêncio das ditaduras, não é? A senhora estava se referindo a isso que se atribuí ao PT, que há uma tentativa de controlar a liberdade de imprensa no Brasil? (...)

Presidente eleita – Veja bem, você tem de distinguir duas coisas: marco regulatório de um controle do conteúdo na mídia. O controle social da mídia, se for de conteúdo, ele é um absurdo! É, de fato, um acinte à liberdade de imprensa, com esse acinte eu não compactuo. Jamais compactuarei.

Apresentador – A senhora vetaria se chegasse à sua mesa?

Presidente eleita – Se chegar na minha mesa qualquer tentativa de coibir a imprensa, no que se refere a divulgação de ideias, posições, propostas, opiniões, enfim, tudo que for conteúdo, eu acho que é isso que eu falei mesmo, o barulho da imprensa , seja que crítica for, ele é construtivo. Mesmo quando você discorda dele. Agora, isso não é um milhão de vezes, é infinitas vezes melhor que o silêncio das ditaduras. Isso é uma coisa.

Outra coisa diferente é a questão do marco regulatório. Porque o marco regulatório é outra questão. Vou tentar explicar, com alguns exemplos.

Apresentador – Para que a gente consiga entender, exatamente, a questão.

Presidente eleita – Com exemplos. Por exemplo: a participação do capital estrangeiro. Você tem todo o país regulamenta a participação do capital estrangeiro nas suas diferentes mídias. Outra questão, que é importantíssima, é o fato de que o mundo está mudando em uma velocidade enorme. Então, você vai ter de regular, de alguma forma, a interação entre as mídias, porque, hoje, quem faz isso não pode fazer aquilo, que não pode fazer aquele outro. O problema do cabo, o problema do sinal aberto, como é que junta tudo isso com internet; mesmo assim eu acho que a gente tem de ter muito cuidado.

Você tem de fazer um marco regulatório que permita que haja adaptações ao longo do tempo. Por quê? Porque, eu não sei se você lembra, em 80, nos anos 80, 90, a telefonia fixa era uma potência. Cada vez mais, com a base da internet, você tem a possibilidade, em cima da internet, de ter TV, telefonia, celular, enfim. O mundo está mudando, então até isso você vai ter de considerar. Você não pode ter, também, um marco regulatório que desconheça a existência da banda larga. E se você vai poder, ou não vai poder, fazer televisão, em que condições você vai fazer televisão. Isso o Brasil vai ter de regular minimamente, até porque tem casos que, se você não fizer isso, você deixa que haja uma concorrência meio desproporcional entre diferentes organismos.

Apresentador – Ok, muito obrigado pela resposta.


[Curiosamente essa parte da entrevista não consta do
vídeo disponibilizado no site do Jornal da Band]

Confusão deliberada

Um marco regulatório se refere à regulação do mercado de mídia e à garantia de direitos humanos fundamentais. A regulação é necessária para impedir a propriedade cruzada e a concentração do controle nas mãos de umas poucas famílias e oligarquias políticas; garantir competição, pluralidade e diversidade. Para impedir a continuidade do "coronelismo eletrônico"; garantir o direito de resposta, inclusive o direito difuso, e o direito de antena. Em particular, marco regulatório se refere à radiodifusão (como se sabe, mas é sempre bom relembrar, uma concessão pública) e às novas tecnologias (internet, banda larga, telefonia móvel etc.).

Como diz a célebre frase do juiz Byron White da Suprema Corte dos Estados Unidos, "é o direito dos telespectadores e ouvintes, não o direito dos controladores da radiodifusão, que é soberano".

É disso que se trata.

Pergunto ao eventual leitor(a) se ele acredita que em democracias como os Estados Unidos, a Inglaterra, a França, a Alemanha, Portugal, Espanha – para citar apenas alguns –, a liberdade da imprensa vive sob permanente ameaça? A comparação faz sentido no atual contexto brasileiro porque esses são países onde existe, há décadas, marco regulatório para o campo das comunicações, vale dizer, regulação da mídia.

A legislação ignorada

No Brasil, tanto a lei quanto a Constituição são cristalinas sobre a necessidade de fiscalização e regulação das concessões de radiodifusão. Ademais, os avanços tecnológicos das últimas décadas, que têm como marco a revolução digital e provocaram a chamada "convergência de mídias" pela diluição das fronteiras entre as telecomunicações e a radiodifusão, tornaram inevitável a regulação do setor.

Mais uma vez: é disso que se trata.

O Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117, de 27 de agosto de 1962) prevê no seu artigo 10:
Art. 10. Compete privativamente à União:

II – fiscalizar os Serviços de telecomunicações por ela concedidos, autorizados ou permitidos.


Além disso, o código admite a punição para o caso de abusos de concessionários. Está escrito na lei:
Art. 52. A liberdade de radiodifusão não exclui a punição dos que praticarem abusos no seu exercício.

Art. 53. Constitui abuso, no exercício de liberdade da radiodifusão, o emprêgo dêsse meio de comunicação para a prática de crime ou contravenção previstos na legislação em vigor no País, inclusive: (
Redação dada pelo Decreto-Lei nº 236, de 1968)


Alguns exemplos de abusos citados na Lei:e) promover campanha discriminatória de classe, côr, raça ou religião; (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 236, de 1968)

(...)

g) comprometer as relações internacionais do País; (
Redação dada pelo Decreto-Lei nº 236, de 1968)


Por outro lado, o Decreto n. 52.795 de 1963, que regulamenta os serviços de radiodifusão, antecipa normas e princípios que seriam, mais tarde, incorporados à Constituição de 1988. Está lá:Art. 28 – As concessionárias e permissionárias de serviços de radiodifusão, além de outros que o Governo julgue convenientes aos interesses nacionais, estão sujeitas aos seguintes preceitos e obrigações: (Redação dada pelo Decreto nº 88067, de 26.1.1983)

11- subordinar os programas de informação, divertimento, propaganda e publicidade às finalidades educativas e culturais inerentes à radiodifusão;

12 – na organização da programação:

a) manter um elevado sentido moral e cívico, não permitindo a transmissão de espetáculos, trechos musicais cantados, quadros, anedotas ou palavras contrárias à moral familiar e aos bons costumes;

b) não transmitir programas que atentem contra o sentimento público, expondo pessoas a situações que, de alguma forma, redundem em constrangimento, ainda que seu objetivo seja jornalístico;

c) destinar um mínimo de 5% (cinco por cento) do horário de sua programação diária à transmissão de serviço noticioso;

d) limitar ao máximo de 25% (vinte e cinco por cento) do horário da sua programação diária o tempo destinado à publicidade comercial;

e) reservar 5 (cinco) horas semanais para a transmissão de programas educacionais.


Por fim, a Constituição de 1988, prevê, especificamente, leis federais para a regulação de diferentes aspectos das comunicações, assim como a instalação de um Conselho para auxiliar o Congresso Nacional em qualquer assunto relativo ao capítulo "Da Comunicação Social".Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

(...)

§ 3º – Compete à lei federal:

I – regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada;

II – estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente.

§ 4º – A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso.

§ 5º – Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio.

(...)

Art. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:

I – preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas;

II – promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação;

III – regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei;

IV – respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

Art. 222. (...)

§ 3º Os meios de comunicação social eletrônica, independentemente da tecnologia utilizada para a prestação do serviço, deverão observar os princípios enunciados no art. 221, na forma de lei específica, que também garantirá a prioridade de profissionais brasileiros na execução de produções nacionais. (
Incluído pela Emenda Constitucional nº 36, de 2002)

(...)

Art. 223. Compete ao Poder Executivo outorgar e renovar concessão, permissão e autorização para o serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens, observado o princípio da complementaridade dos sistemas privado, público e estatal.

(...)

Art. 224. Para os efeitos do disposto neste capítulo, o Congresso Nacional instituirá, como seu órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Social, na forma da lei.


Direito à comunicação

Como disse a presidente eleita, há que se distinguir "marco regulatório de um controle do conteúdo na mídia". Quem os confunde está, de fato, querendo evitar a regulação do mercado e a perda de privilégios históricos.

Insisto: regular a mídia é ampliar a liberdade de expressão, a liberdade da imprensa, a pluralidade e a diversidade. Regular a mídia é garantir mais – e não menos – democracia. É caminhar no sentido do pleno reconhecimento do direito à comunicação como um direito fundamental da cidadania.

É disso que se trata.


Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.


A mídia troglodita e privatista quer o fim do Enem

 Com da troca de ordem de gabarito do Enem no sábado, 6, durante realização desse exame, os setores privatistas, trogloditas e hegemônicos da Mídia, reacionários a qualquer forma de ampliação do acesso ao ensino público, dispararam para em coro. Em mantra coletivo, vociferam pela extinção desse modelo de seleção para o ingresso no ensino superior, por meio de chamadas como “Desastre” e “Perda de credibilidade”.

A imprensa grande, bem representada nacionalmente pela editora Abril, que tem na Veja sua principal voz,  é ilustrativa nesse sentido, considerando sua clara orientação capitalista do ensino. A solenidade de entrega do Prêmio Victor Civita Educador Nota 10, por exemplo, realizada no dia 23 de outubro,  teve a participação em peso dos grande “pensadores” da mercantilização do ensino.  Para esse coro anti-enem, sobraram espaços de visibilidade para os críticos tucanos, ainda ressentidos pela derrota eleitoral.

Sabemos dos limites e desafios de qualquer modelo que se proponha a socializar o acesso em um país de dimensões continentais. No entanto, aperfeiçoamento e qualificação devieram dos processos de aplicação e difusão desses sistemas deve ser o norte, como deve ser esse o rumo de nossa própria democracia, ainda em construção.

* Esclareço aos leitores que, a partir de amanhã, passarei realizar as postagens no final da noite.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Teorias insuficientes para a complexidade

Tantas são as teorias existentes nas áreas de ciências sociais para explicar a central questão Individuo x Sociedade, que chegam a se repetir, regularmente. Nomes se criam para dizer a mesma coisa. O fato é que inexistem conceitos ou modelos que dêem conta das possibilidades inesgotáveis de organização e expressão da raça humana em coletividade. Mesmo assiim, os pensadores contribuem para que enxergamos melhor essas tendências de apropriação da esfera pública e dos bens simbólicos nessa concorrencia entre corporações, religiões, partidos e outras fontes de povoamento do imaginário coletivo.

Nós, as vacas e o jornalismo

* Saindo ontem da estação mercado do trensurb, no Centro de Porto Alegre, deparo com uma das vaquinhas da exposição Cow Parade . "Go Vegetariam - as futuras finadas agradecem", estava inscrito nessa peça. A princípio, cheguei a pensar que esse era o tema geral da campnha. Como não o vi abordado em outras peças, conclui que não. Que pena, seria essa uma ótima iniciativa para questionar o nosso modo de vida, a partir de uma estética mais reflexiva sobre a nossa relação com outros seres vivos.

*Belas palavras do jornalista Ignacio Ramonet, sobre a crise de identidade que enfrenta o jornalismo na atualidade. O depoimento pode ser conferido no site da Carta Maior.

* Nesse período de fim de ano, começamos a ficar mais cansados. É natural, acúmulo de atividades durante todo o ano, concentra o desgaste. Na rotina de vida que vivemos, de viver mais para o trabalho que para usufruir o que gostamos, tendemos a alimentar essa prática de prazer episódico. Uma pena. Tendo a crer, junto com alguns milhares de pessoas que não tiram férias, que juntar o trabalho ao prazer é a melhor saída para tornar a vida mais palatável.

sábado, 6 de novembro de 2010

A cor da cultura, para além da novela das oito

Ainda que os programas da Rede Globo tenham por tradição caricaturizar ou descaracterizar a questão étnico racial no Brasil, vez por outra, em alguma fresta, pintam coisas que valem a pena se conhecer por ali. Uma pena que estas preciosidades, ao contrário das novelas, estão sempre em horários inacessíveis para a maioria da população e, consequentemente pouco atraente para os jovens.

O Ação é um dessas raridades interessantes. Serginho Groisman tem o talento e a autoridade para apresentar os assuntos em questão, sempre em torno de iniciativas do terceiro setor para a área social. No caso de A cor da cultura, série que estreou hoje nesse programa, em quatro edições, a abordagem é sobre a influência afro-descendente na cultura brasileira e o que está sendo feito nos estados onde se concentram a maioria das populações dessa etnia.

Por ordem, abriu com a Bahia, seguindo por Maranhão, Minas Gerais e, finalmente, uma edição especial sobre as mulheres negras. Em boa hora um espaço para esse tema. Vale a pena conferir.

Em busca de um palco (Crônica)

Nicanor falava pausadamente, querendo sensibilizar sem demonstrar intencionalidade. Ela ainda não casou de novo, espera por ti. Ninguém toca diretamente no assunto, mas às vezes ela fala espontaneamente, com uma certa naturalidade, sempre com verbos expressados no futuro do presente. “Quando ele retornar. Quando tudo isso acabar. Quando a nossa vida voltar a ser como era”. A menina já completou cinco, deves saber. Está cada vez mais linda. Também ainda fala o teu nome às vezes. Nessas alturas daquela fria conversa, ouviu um suspiro, foi quando notou, através do espelho, uma fina lágrima no rosto de José. A gota escorria em direção aos lábios, deixando uma perceptível mancha na maquiagem do personagem que se construía.

A sala era pequena, mas luxuosa. A tranqüilidade do ambiente separava, por uma porta e aproximadamente uma hora, um outro mundo, onde a imaginação tinha espaço para acontecer, e muita gente pagava para ver um personagem contemplar os seus medos, dúvidas e desejos. Os dois já estavam ali há mais ou menos uma hora e meia. Fazia quatro anos que não se falavam.

Desde que José virou a cabeça e fugiu da pequena Tacaratu, sua terra natal no interior do Pernambuco, para a gigantesca e misteriosa São Paulo, sem deixar endereço, nem mandar notícias – como comentavam amigos e vizinhos – tudo ficou mais difícil para a jovem Gabriela, que se negava a voltar para a casa dos pais, acreditando no retorno do marido. A pequena Clarice, que tinha, então, um aninho, não chegou a tomar plena consciência da imagem paterna, mas era seguidamente lembrada pela mãe. “Quando o teu pai retornar de viagem, ele vai passear contigo todos os fins de semana na pracinha. Vai comprar sorvete para você e te acompanhar na gangorra”, não cansava de repetir Gabriela que, apesar das constantes noites de choro e sono perdido, preservava a esperança e beleza jovial de seus 25. Nunca entendeu a misteriosa fuga do companheiro, que amava, e cuja ausência apenas reforçou essa certeza. Mas teimava em acreditar que haveria uma explicação para tudo. Que logo ele retornaria com argumentos plausíveis, e tudo voltaria ao normal.

"Escute meu irmão, você pode continuar sem falar nada. É o seu direito. Mesmo sem entender as suas razões, não tenho dúvidas de que amava a sua família, e foi por isso que vim de tão longe para te pedir, em nome de duas pessoas, que volte comigo. Parto essa noite, no ônibus das 22h. Acreditando que ainda lhe conheço, comprei uma passagem para você. Deixo aqui o cartão da pensão, onde estou até ás 21h15. Pense, e faça o que o teu coração mandar. Continuarei te considerando sempre, independente da tua decisão", declarou Nicanor, despedindo-se com um apertado abraço no amigo, que parecia um corpo inerte, como que sufocado pela angústia de um grito que não podia sair de suas entranhas. Quando ficou novamente sozinho, José olhou no relógio e viu que faltavam apenas 15min para o espetáculo. Lembranças desfilavam rapidamente em seus pensamentos.

Nunca teve coragem, nem disposição para falar a ninguém sobre o exame médico que decidiu fazer, muito menos o diagnóstico clínico das dores que sentia constantemente no coração, e sobre as quais também poucos sabiam. Cinco anos de vida era a projeção de sua existência, conforme havia lhe revelado o médico, após muita insistência. Foi então que, desesperado e deprimido com a notícia, sem saber se podia, ou tinha o direito de contar a alguém, tomou a decisão e partir para longe e apostar o seu resto de vida em um sonho sempre adiado: o teatro. Com uma força, que não sabia de onde vinha, suportou todas as perdas que o coração sentiu, e as barreiras que a consciência impôs. Coragem ou covardia? Nunca decifrou. Mas, como voltar com uma explicação que justificasse as suas atitudes?  Ah, isso sim era ainda pior.

“O show inicia em 10 minutos”, as palavras atravessaram como uma espada afiada as distantes reflexões de José. Era o grito do diretor, que abriu a porta de supetão, com meio corpo para dentro do camarin.

A platéia aguardava a apresentação do monólogo ‘Saudades de mim’, há três semanas com recorde de bilheteria, tendo conquistado a simpatia quase unânime da crítica paulistana.

"Senhoras e senhores, boa noite. Dentro de três minutos, vocês terão a oportunidade de assistir a mais nova  sensacional revelação do teatro brasileiro. Para quem nunca viu um artista interpretar com viva emoção os mais profundos sentimentos, através de uma reflexão individual sobre o sentido do amor na existência humana, preparem-se. No mais, deixo que o brilho do espetáculo fale por si".

Nesse instante, as luzes se apagam, explodem gritos e assovios e a expectativa impera. Ansioso pro chamar a estrela da noite, o diretor dirige-se ao camarim, abrindo novamente a porta com o tradicional grito de “Pode entrar, José!”.

Surpreendentemente, porém, nota que a sala estava vazia. Na mesa do camarim, um bilhete escrito por mãos visivelmente trêmulas. “A ficção termina e um outro espetáculo recomeça, aquele em que o personagem pode, além de representar, viver o que ama. Volto para onde plantei meus sonhos mais profundos. Desculpe por isso e obrigado por tudo. José”. No palco, o experiente diretor rende-se à perplexidade, sozinho, atônito, diante dos gritos da platéia eufórica, imaginado tudo em torno de apenas uma pergunta: Por quê?

Prólogo: Alguns quilômetros dali, um taxista conduz um estranho passageiro. Há dez anos de ofício, Pedro já havia visto muitas caras estranhas, mas, sem dúvidas, era diferente de tudo o que já conhecera aquele palhaço de maquiagem borrada e semblante sério, que parou-lhe, com respiração ofegante, uma pequena mala, e  deu ordem firme e direta: “Tietê, velocidade máxima. Pago em dobro”.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Animal, desmasiadamente animal

Desconserta a condição humana o comportamento da cadela da espanha, que adotou porquinho rejeitado por açougueiro, em vista de ser muito pequeno para o abate. Veja a matéria completa aqui.

Separatismo e xenofobia em SP e outros cantos

É digna de atenção as recentes manifestações de jovens paulistanos, esclarecidos, identificados com movimentos pelo controle e monitoramento das migrações, bem como uma maior restrição das atenções dos governantes paulistas aos mais “originalmente” paulistas. Há algum tempo já tinha conhecimento de posições e grupos, inclusive de cunho neonazista, que difundiam abertamente nas regiões sul e sudeste, discursos e práticas contra negros, homossexuais e nordestinos.

No caso dos movimentos mais recentes, como o “São Paulo para os paulistas”, que assumiu maior visibilidade a partir do resultado dessas eleições, - e do suposto determinante da votação nordestina na vitória de Dilma (já, comprovadamente, refutado) – há nesses novos grupos outro perfil, ainda que também expressem uma favorabilidade aberta à restrição, ou controle, das migrações. Neles, há um discurso mais racional e abertamente assumido, como o Movimento São Paulo Independente (MSPI). As iniciativas separatistas não são fenômeno novo nos estados brasileiros, acompanham nossa história, assim como seu caráter elitista.

Que há preconceito em SP contra os nordestinos, isso não há dúvida. E que a imigração desenfreada é um problema para a organização das políticas públicas nos estados, também é um fato. No entanto, o direito de ir e vir é uma conquista positiva de nossa constituição, porque denota a nossa unidade como nação. Por outro lado, seria, no mínimo, estúpido, ignorar a sistêmica contribuição dos nordestinos, desde os anos 70, para o desenvolvimento, a cultura, e a qualidade cosmopolita de São Paulo – que é, aliás, apresentado pelos próprios paulistanos como sua maior marca.  É perturbante, por outro lado, o caráter discriminador que pode estar envolvendo tais discursos.

O bairrismo e a as iniciativas de articulações fechadas ante ao estranho são fenômenos da sociabilidade, presentes, em algum nível, em todas as culturas regionais brasileiras. O movimento separatista do RS, que volta e meia retorna a pauta de alguns ativistas dessa idéia, expressa bem isso. Que há necessidade de se pensar e planejar políticas públicas adequadas ao País, sob suas condições geográficas continentais e com foco em suas populações locais de cada região-estado-cidade, não há duvidas. A quantidade expressiva de estrangeiros, indiscriminadamente espalhados pelo interior Amazônia, com os mais diferentes objetivos, também indica isso.

No entanto, é preciso que tenhamos sempre claro que a mistura étnica, a liberdade de locomoção pelos quatro cantos do território nacional e a unidade nacional em torno de valores comuns são mais do que qualidades especiais de nossa cultura, direta ou indiretamente e asseguradas na constituição. Tratam-se de características que formam um patrimônio valioso, que afirma, mais do que tudo, a nossa condição de brasileiros.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

CPMF, Mitos e a Feira glamourizada

* Nesse momento, em que cogita-se no meios políticos a possibilidade de reapresentar a CPMF como projeto para supera o déficit na saúde, recomeça o mantra dos neoliberais, que disparam com o desgastado discurso sobre o excesso de impostos. Sou, e sempre fui, favorável a CPMF porque a compreendo com um imposto distributivo e solidário, necessário em um País de profundas desigualdades como o Brasil. Se houve desvios dos recursos dessa contribuição, que é progressiva, para outras finalidades, isso não é motivo para se ter jogado fora a “água da bacia, a bacia e a criança”. Não me surpreende que, desde sempre, têm sido os deputados do DEM os maiores opositores a essa contribuição, que pouco atingiu e atingiria os brasileiros de menor poder aquisitvo. Especialmente pela origem de classe desse partido – dos 43, 28 dos deputados eleitos são milionários, a segunda, entre as maiores bancadas de grandes fortunas na Câmara.

* Enquanto isso, no RS, a Feira do livro tem um lançamento interessante, da obra História regional da infâmia - O destino dos negros e outras iniquidades basileiras (ou como se produzem os imaginários), resultado de um trabalho historiográfico desse jornalista-historiador-colunista, bem na contra-mão do tradicionalismo rançoso que predomina pelo Sul. O endosso e elogios  a esse livro pelo pesquisador Mário Maestri – um experiente pesquisador das questões afro-brasileiras – destaca a qualidade desse trabalho.

* E falando em Feira, infelizmente, novamente, a cultura do glamour parece substituir o que deveriam ser as reais estrelas desse evento o livro, a literatura e a leitura. Estava ontem mesmo comentando com um colega de trabalho que gostaria de estar vivo o dia que a Feira assumisse uma vocação mais social, se libertando dessa cultura concentrada e elitizada em torno de “compartimentos de celebridades”, que costuma marcar os eventos regionais brasileiros. O rio Guaíba, tão escondido, cercado e ignorrado, poderia ser um caminho para isso. Durante o período da Feira, porque não, um ou mais barcos poderiam, carregados de livros e escritores, percorrer as ilhas do entorno do Guaíba, distribuindo o amor a leitura a quem muito precisa os ribeirinhos dessas localidades. As comunidades das vilas mais periféricas de Porto Alegre também poderiam ser contempladas em uma visão mais descentralizadora da cultura, e menos festiva. Mas isso ainda está no meu plano utópico do que é uma Feira do Livro. Quiçá, sobreviva para ver.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Micro crônica - O homem que sorria diferente

Era uma cidade estranha, onde, sempre, todos mantinham um sorriso largo, onde quer que estivessem, o que quer que acontecesse. Um dia, porém, um sujeito forasteiro, vestido discretamente, em passos pequenos, entrou em um bar colorido, em intenso barulho, na terra do sorriso. De semblante duro, vários presentes voltaram a atenção àquele sujeito, e em silêncio ficaram. O atendente, mostrando os dentes, perguntou o que desejava, e ele pediu um café amargo, nada típico naquela terra de cerveja e coca-cola, as bebidas alegres. No terceiro gole, enquanto cuidava no canto do olho, o trabalhador do bar, com um sorriso aberto, não se conteve. “De onde vens todos são assim, de cara sombria?". Ante isso, o homem voltou-se ao perguntante e respondeu, com um olhar distante: “Venho de um lugar comum, nem tão feliz, nem tão triste; Lá também sorrimos muito, mas de  outras formas, com olhares, atitudes ou palavras. A cada um cabe o seu entendimento, conforme a sua sensibilidade”. O atendente, sem desmanchar completamente o sorriso, calou-se em um ar de perplexidade. Ainda em silêncio, o viajante terminou beber, pagou e saiu. E o barulho, e os sorrisos, voltaram tudo ao normal. Apesar disso, aquele trabalhador do bar, após atender aquele estranho, nunca mais conseguiu sorrir do mesmo jeito.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Roda isonsa

Assisti atentamente ontem o Roda Viva, da TV Cultura, com o ex-deputado José Dirceu, e mais uma vez me decepcionei com o desempenho pífio da nova apresentadora e mediadora, Marília Gabriela. Programa historicamente dinâmico, inteligente e equilibrado, tem sido ultimamente caracterizado pela superficialidade e homogenização de idéias dos entrevistados. A parte a presença rara de de um representante da revista Carta Capital, o reporter Sergio Lírio (nunca tinha visto antes ali um jornalista de publicações progressistas), o programa manteve a linha que tem marcado a atuação de Gabriela, desde que assumiu a mediação - perguntas rasas e com focos uniformes.

Dirceu, diferentemente, foi mais que o centro da Roda, o destaque pela qualidade das respostas, o equilíbrio nos contrapontos e a segurança nos argumentos, mesmo diante da metralhaddora de provocações, às vezes ridículas. Sobrou - como de práxis na mediocridade do jornalismo conservador brasileiro - questionamentos ideológicos, como o de relações "impróprias" do governo Lula com os presidentes da Venezuela, Coréia do Norte, Irã e outros Países do "Eixo do Mal" na cartilha da imprensa grande nacional. Faltou, isto sim, relações e fatos que tornassem a entrevista esclarecedora ou explorassem contradições concretas no discurso do entrevistado. Em lugar disso, predominaram perguntas baseadas em especulações criadas pela própria imprensa ou o senso comum. Dirceu pode, acho provável, ser condenado. Mas fica claro que há uma tendência explícita de setores da imprensa brasileira de condenar antes da justiça.

Foi bem interessante, por outro lado, observar as posições de um experiente editor, como Augusto Nunes, que demonstrou absoluto alinhamento com a posição dos donos da grande mídia. Entre sorrisos irônicos e declarações sarcasticamente infantis, Nunes demonstrou pactuar com essa tendência das empresas de comunicação, de não admitir, sequer a idéia, da sociedade civil organizada ter direitos de debater e atuar sobre a garantia da não-monopólio dos meios de comunicação no Brasil, bem como sobre a diversidade e qualidade do que é veiculado nessa mídia. Trata-se de um debate, sim, urgente e necessário, sobre o qual, aliás, o Roda Viva seria um ótimo espaço para dar o pontapé inicial.

Entendo que este programa, que ainda é o melhor espaço de entrevista do País, tem como sua qualidade central a diversidade de olhares e enfoques. Ultimamente, no entanto, na gestão tucana, tem caminhado na direção contrária a isso.  E a versão gaúcha, o Frente a Frente, da TVE, tem sido uma caricatura disso.

Assista um dos blocos mais tensos da entrevista dom José Dirceu aqui.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Dilma Rousseff, 1.ª presidenta eleita da história do Brasil




Minhas amigas e meus amigos de todo o Brasil,

É imensa a minha alegria de estar aqui. Recebi hoje de milhões de brasileiras e brasileiros a missão mais importante de minha vida. Este fato, para  além de minha pessoa, é uma demonstração do avanço democrático do nosso país: pela primeira vez uma mulher presidirá o Brasil. Já registro portanto aqui meu primeiro compromisso após a eleição: honrar as mulheres brasileiras, para que este fato, até hoje inédito, se transforme num evento natural. E que ele possa se repetir e se ampliar nas empresas, nas instituições civis, nas entidades representativas de toda nossa sociedade.
A igualdade de oportunidades para homens e mulheres é um principio essencial da democracia. Gostaria muito que os pais e mães de meninas olhassem hoje nos olhos delas, e lhes dissessem: SIM, a mulher pode!
Minha alegria é ainda maior pelo fato de que a presença de uma mulher na presidência da República se dá pelo caminho sagrado do voto, da decisão democrática do eleitor, do exercício mais elevado da cidadania. Por isso, registro aqui outro compromisso com meu país:
  • Valorizar a democracia em toda sua dimensão, desde o direito de opinião e expressão até os direitos essenciais da alimentação, do emprego e da renda, da moradia digna e da paz social.
  • Zelarei pela mais ampla e irrestrita liberdade de imprensa.
  • Zelarei pela mais ampla liberdade religiosa e de culto.
  • Zelarei pela observação criteriosa e permanente dos direitos humanos tão claramente consagrados em nossa constituição.
  • Zelarei, enfim, pela nossa Constituição, dever maior da presidência da República.
Nesta longa jornada que me trouxe aqui pude falar e visitar todas as nossas regiões. O que mais me deu esperanças foi a capacidade imensa do nosso povo, de agarrar uma oportunidade, por mais singela que seja, e com ela construir um mundo melhor para sua família. É simplesmente incrível a capacidade de criar e empreender do nosso povo. Por isso, reforço aqui meu compromisso fundamental: a erradicação da miséria e a criação de oportunidades para todos os brasileiros e brasileiras.
Ressalto, entretanto, que esta ambiciosa meta não será realizada pela vontade do governo. Ela é um chamado à nação, aos empresários, às igrejas, às entidades civis, às universidades, à imprensa, aos governadores, aos prefeitos e a todas as pessoas de bem.
Não podemos descansar enquanto houver brasileiros com fome, enquanto houver famílias morando nas ruas, enquanto crianças pobres estiverem abandonadas à própria sorte. A erradicação da miséria nos próximos anos é, assim, uma meta que assumo, mas para a qual peço humildemente o apoio de todos que possam ajudar o país no trabalho de superar esse abismo que ainda nos separa de ser uma nação desenvolvida.
O Brasil é uma terra generosa e sempre devolverá em dobro cada semente que for plantada com mão amorosa e olhar para o futuro. Minha convicção de assumir a meta de erradicar a miséria vem, não de uma certeza teórica, mas da experiência viva do nosso governo, no qual uma imensa mobilidade social se realizou, tornando hoje possível um sonho que sempre pareceu impossível.
Reconheço que teremos um duro trabalho para qualificar o nosso desenvolvimento econômico. Essa nova era de prosperidade criada pela genialidade do presidente Lula e pela força do povo e de nossos empreendedores encontra seu momento de maior potencial numa época em que a economia das grandes nações se encontra abalada.
No curto prazo, não contaremos com a pujança das economias desenvolvidas para impulsionar nosso crescimento. Por isso, se tornam ainda mais importantes nossas próprias políticas, nosso próprio mercado, nossa própria poupança e nossas próprias decisões econômicas.
Longe de dizer, com isso, que pretendamos fechar o país ao mundo. Muito ao contrário, continuaremos propugnando pela ampla abertura das relações comerciais e pelo fim do protecionismo dos países ricos, que impede as nações pobres de realizar plenamente suas vocações.
Mas é preciso reconhecer que teremos grandes responsabilidades num mundo que enfrenta ainda os efeitos de uma crise financeira de grandes proporções e que se socorre de mecanismos nem sempre adequados, nem sempre equilibrados, para a retomada do crescimento.
É preciso, no plano multilateral, estabelecer regras mais claras e mais cuidadosas para a retomada dos mercados de financiamento, limitando a alavancagem  e a especulação desmedida, que aumentam a volatilidade dos capitais e das moedas. Atuaremos firmemente nos fóruns internacionais com este objetivo.
Cuidaremos de nossa economia com toda responsabilidade. O povo brasileiro não aceita mais a inflação como solução irresponsável para eventuais desequilíbrios. O povo brasileiro não aceita que governos  gastem acima do que seja sustentável.
Por isso, faremos todos os esforços pela melhoria da qualidade do gasto público, pela simplificação e atenuação da tributação e pela qualificação dos serviços públicos. Mas recusamos as visões de ajustes que recaem sobre os programas sociais, os serviços essenciais à população e os necessários investimentos.
Sim, buscaremos o desenvolvimento de longo prazo, a taxas elevadas, social e ambientalmente sustentáveis. Para isso zelaremos pela poupança pública.
Zelaremos pela meritocracia no funcionalismo e pela excelência do serviço público. Zelarei pelo aperfeiçoamento de todos os mecanismos que liberem a capacidade empreendedora de nosso empresariado e de nosso povo. Valorizarei o Micro Empreendedor Individual, para formalizar milhões de negócios individuais ou familiares, ampliarei os limites do Supersimples e construirei modernos mecanismos de aperfeiçoamento econômico, como fez nosso governo na construção civil, no setor elétrico, na lei de recuperação de empresas, entre outros.
As agências reguladoras terão todo respaldo para atuar com determinação e autonomia, voltadas para a promoção da inovação, da saudável concorrência e da efetividade dos setores regulados.

Apresentaremos sempre com clareza nossos planos de ação governamental. Levaremos ao debate público as grandes questões nacionais. Trataremos sempre com transparência nossas metas, nossos resultados, nossas dificuldades.
Mas acima de tudo quero reafirmar nosso compromisso com a estabilidade da economia e das regras econômicas, dos contratos firmados e das conquistas estabelecidas.
Trataremos os recursos provenientes de nossas riquezas sempre com pensamento de longo prazo. Por isso trabalharei no Congresso pela aprovação do Fundo Social do Pré-Sal. Por meio dele queremos realizar muitos de nossos objetivos sociais.
Recusaremos o gasto efêmero que deixa para as futuras gerações apenas as dívidas e a desesperança.
O Fundo Social é mecanismo de poupança de longo prazo, para apoiar as atuais e futuras gerações. Ele é o mais importante fruto do novo modelo que propusemos  para a exploração do pré-sal, que reserva à Nação e ao povo a parcela mais importante dessas riquezas.
Definitivamente, não alienaremos nossas riquezas para deixar ao povo só migalhas. Me comprometi nesta campanha com a qualificação da Educação e dos Serviços de Saúde. Me comprometi também com a melhoria da segurança pública. Com o combate às drogas que infelicitam nossas famílias.
Reafirmo aqui estes compromissos. Nomearei ministros e equipes de primeira qualidade para realizar esses objetivos. Mas acompanharei pessoalmente estas áreas capitais para o desenvolvimento de nosso povo.
A visão moderna do desenvolvimento econômico é aquela que valoriza o trabalhador e sua família, o cidadão e sua comunidade, oferecendo acesso a educação e saúde de qualidade. É aquela que convive com o meio ambiente sem agredí-lo e sem criar passivos maiores que as conquistas do próprio desenvolvimento.
Não pretendo me estender aqui, neste primeiro pronunciamento ao país, mas quero registrar que todos os compromissos que assumi, perseguirei de forma dedicada e carinhosa. Disse na campanha que os mais necessitados, as crianças, os jovens, as pessoas com deficiência, o trabalhador desempregado, o idoso teriam toda minha atenção. Reafirmo aqui este compromisso.
Fui eleita com uma coligação de dez partidos e com apoio de lideranças de vários outros partidos. Vou com eles construir um governo onde a capacidade profissional, a liderança e a disposição de servir ao país será o critério fundamental.
Vou valorizar os quadros profissionais da administração pública, independente de filiação partidária.
Dirijo-me também aos partidos de oposição e aos setores da sociedade que não estiveram conosco nesta caminhada. Estendo minha mão a eles. De minha parte não haverá discriminação, privilégios ou compadrio.
A partir de minha posse serei presidenta de todos os brasileiros e brasileiras, respeitando as diferenças de opinião, de crença e de orientação política.
Nosso país precisa ainda melhorar a conduta e a qualidade da política. Quero empenhar-me, junto com todos os partidos, numa reforma política que eleve os valores republicanos, avançando em nossa jovem democracia.
Ao mesmo tempo, afirmo com clareza que valorizarei a transparência na administração pública. Não haverá compromisso com o erro, o desvio e o malfeito. Serei rígida na defesa do interesse público em todos os níveis de meu governo. Os órgãos de controle e de fiscalização trabalharão com meu respaldo, sem jamais perseguir adversários ou proteger amigos.
Deixei para o final os meus agradecimentos, pois quero destacá-los. Primeiro, ao povo que me dedicou seu apoio. Serei eternamente grata pela oportunidade única de servir ao meu país no seu mais alto posto. Prometo devolver em dobro todo o carinho recebido, em todos os lugares que passei.
Mas agradeço respeitosamente também aqueles que votaram no primeiro e no segundo turno em outros candidatos ou candidatas. Eles também fizeram valer a festa da democracia.
Agradeço as lideranças partidárias que me apoiaram e comandaram esta jornada, meus assessores, minhas equipes de trabalho e todos os que dedicaram meses inteiros a esse árduo trabalho. Agradeço a imprensa brasileira e estrangeira que aqui atua e cada um de seus profissionais pela cobertura do processo eleitoral.
Não nego a vocês que, por vezes, algumas das coisas difundidas me deixaram triste. Mas quem, como eu, lutou pela democracia e pelo direito de livre opinião arriscando a vida; quem, como eu e tantos outros que não estão mais entre nós, dedicamos toda nossa juventude ao direito de expressão, nós somos naturalmente amantes da liberdade. Por isso, não carregarei nenhum ressentimento.
Disse e repito que prefiro o barulho da imprensa livre ao silencio das ditaduras. As criticas do jornalismo livre ajudam ao pais e são essenciais aos governos democráticos, apontando erros e trazendo o necessário contraditório.
Agradeço muito especialmente ao presidente Lula. Ter a honra de seu apoio, ter o privilégio de sua convivência, ter aprendido com sua imensa sabedoria, são coisas que se guarda para a vida toda. Conviver durante todos estes anos com ele me deu a exata dimensão do governante justo e do líder apaixonado por seu pais e por sua gente. A alegria que sinto pela minha vitória se mistura com a emoção da sua despedida.
Sei que um líder como Lula nunca estará longe de seu povo e de cada um de nós. Baterei muito a sua porta e, tenho certeza, que a encontrarei sempre aberta.
Sei que a distância de um cargo nada significa para um homem de tamanha grandeza e generosidade. A tarefa de sucedê-lo é  difícil e desafiadora. Mas saberei honrar seu legado. Saberei consolidar e avançar sua obra.
Aprendi com ele que quando se governa pensando no interesse público e nos mais necessitados uma imensa força brota do nosso povo. Uma força que leva o país para frente e ajuda a vencer os maiores desafios.
Passada a eleição agora é hora de trabalho. Passado o debate de projetos agora é hora de união. União pela educação, união pelo desenvolvimento, união pelo país. Junto comigo foram eleitos novos governadores, deputados, senadores. Ao parabenizá-los, convido a todos, independente de cor partidária, para uma ação determinada pelo futuro de nosso país.
Sempre com a convicção de que a Nação Brasileira será exatamente do tamanho daquilo que, juntos, fizermos por ela.
Muito obrigada.


Foto 1: http://www.viomundo.com.br/
Foto 2: Site do PT Nacional